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sexta-feira, 28 de outubro de 2011

Espiritismo e Reencarnação - uma resposta à Sarah

Sarah,

ofereço aqui, em separado, uma resposta às perguntas que você fez em: http://cristianismoprogressista.blogspot.com/2011/10/deus-e-o-sofrimento-humano.html - Aqui responderei suas questões acerca do Espiritismo apenas. Esclareço que quando falo em “espiritismo” aqui, refiro-me à tradição chamada de “kardecista”.

Não gosto de tratar sobre questões como “reencarnação” ou “espiritismo” aqui, já que não as considero como temas tradicionalmente cristãos. A noção de reencarnação, e as ideias a ela atreladas, tais como ensinadas pelo Espiritismo (kardecista, isto é) não é ensinado pela maioria das diferentes tradições teológicas cristãs ocidentais ou orientais, não estão explicitamente expressas na Bíblia (para aqueles que precisam duma confirmação bíblica para construir sua teologia pessoal – o que me parece razoável em se tratando de tradição cristã), e não fazem parte das discussões teológicas cristãs protestantes. (Por que cito tradições teológicas protestantes? Pelo simples fato de eu ser um protestante – mesmo que liberal – e, logicamente, preocupar-me com temas que circulam em minha própria tradição.)

Devo deixar bem claro que, como um unitarista – um cristão protestante liberal – não julgo aqui a natureza da identidade religiosa da tradição espírita, ou seja, se os espíritas consideram-se como cristãos, eles são cristãos para mim. Não poderia negar que também sejam discípulos de Jesus, apesar de compreenderem-no duma maneira diferente da maioria dos outros cristãos – exatamente como ocorre comigo como um unitarista, que também compreendo Jesus duma maneira diferente daquela compreensão da maioria dos outros cristãos. O que direi aqui refere-se à minha própria compreensão do tema, e não a uma visão de como outros unitaristas pensam. Minha visão, devo enfatizar, é a percepção duma pessoa de fora, que não partilha das mesmas ideias defendidas pelos espíritas no que tange à “espiritualidade” (a relação de “espíritos” com este mundo, reencarnação etc). E mesmo minha compreensão das doutrinas espíritas são limitadas, já que não são uma área de interesse para mim, em minhas discussões teológicas etc. O que conheço sobre essa tradição é ou através de minhas leituras, ou através dos exemplos dados pelos espíritas que conheço – que, na maioria das vezes exibem um espírito cristão exemplar.

Para responder à sua pergunta, cito um trecho do Livro dos Espíritos, de Allan Kardec:

“Deus sabe esperar: não apressa a expiação. Entretanto, Deus pode impor uma existência a um Espírito, quando este, por sua inferioridade ou sua má vontade, não está apto a compreender o que poderia ser-lhe mais salutar e quando vê que essa existência pode servir à sua purificação e adiantamento, ao mesmo tempo que encontra nela uma expiação.”
[…]
“Ele [o espírito] escolhe as [provas] que podem ser para ele uma expiação, segundo a natureza de suas faltas, e o faça avançar mais rapidamente. Alguns se impõem uma vida de misérias e privações para tentar suportá-la com coragem. Outros querem se experimentar nas tentações da fortuna e do poder, bem mais perigosas pelo abuso e mau uso que delas se pode fazer, e pelas más paixões que desenvolvem. Outros, enfim, querem experimentar-se pelas lutas que devem sustentar ao contato do vício.” (KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. Tradução de Salvador Gentile. Araras, SP: Instituto de Difusão Espírita, 2002. p. 147.)

Independentemente de as condições da reencarnação se darem por escolha do “espírito” em questão ou por escolha divina, há um sério problema teológico para mim com esta noção. O problema aqui não é a noção de “reencarnação” per se, mas a noção de “expiação”. Pode parecer muito sofisticado, muito justo, eliminar a noção duma expiação efetuada por um Salvador – como aquela na qual creem a maioria dos cristãos protestantes, católicos e ortodoxos, na qual Jesus, o inocente, paga (i.e., expia) pelos pecados dos culpados – em favor de uma, que se constitui num processo, efetuada pelo próprio culpado. Entretanto, eu, não julgo a noção de expiação como necessária, nem muito menos coerente com minha visão de Deus, de justiça, de amor, de eternidade, de vida etc. A noção – ou melhor, o dogma espírita – de reencarnação baseia-se numa série de premissas extremamente problemáticas para mim; para aceitar tal visão, eu teria de aceitar a noção espírita de Deus, de espírito, de verdade, de justiça, de eternidade etc, que contradizem as minhas próprias crenças pessoais sobre esses temas. É, na verdade, uma visão de universo irreconciliável com a minha própria. Em se tratando deste tema, o espiritismo é muito dogmático, já que acorrenta-se a uma noção sem a qual todo o seu edifício teológico desaba.

Nesse sentido, mantenho o que disse anteriormente sobre o dogma da “reencarnação”, no texto no qual essa nossa conversa se iniciou. A ideia pode servir de conforto para muitas pessoas – e eu respeito isso profundamente –, penso que se ela tem o poder de fazê-lo, cumpre uma função e, por isso mesmo, continuará a existir. Entretanto, para mim, ela é ainda mais problemática do que o dogma da expiação de Cristo, pois em si mesma carrega uma noção de justiça e de Deus que eu não aceitaria intelectual nem religiosamente. Mas, novamente, se essa é uma ideia que faz sentido para outras pessoas, os respeito por isso, mesmo que discorde deles.

Espero poder ter respondido parte de suas dúvidas. Separadamente, depois responderei suas outras questões.

Grande abraço! Paz!

+Gibson

domingo, 23 de outubro de 2011

Deus e o sofrimento humano

Sempre fico muito aborrecido quando ouço pessoas – pessoas que creio estarem sinceramente muito bem intencionadas – insinuarem ou dizerem a outras que há um propósito para o sofrimento pelo qual passam, que Deus faz uso da dor para ensinar-nos alguma lição cósmica.

Para algumas dessas pessoas, tudo na vida acontece por uma razão espiritual. Para elas, Deus utiliza a dor e o sofrimento para tornar-nos pessoas melhores e mais elevadas espiritualmente. Elas acreditam que Deus faz uso das guerras, da violência, da tortura, da fome, dos desastres naturais para trazer-nos de volta aos “seus caminhos”.

Minha resposta, obviamente, tem sempre sido a de que não posso acreditar num Deus que utilize violência, tortura, e assassinato de seres humanos para ensinar-nos qualquer lição que seja. Não posso aceitar um plano divino que inclua estupro, homicídio, e tragédias, por exemplo. Essas pessoas me dizem que todos nós aprendemos com essas experiências e, logo, não podemos negar que tenham um sentido. Minha resposta a isso é que algumas pessoas realmente conseguem extrair algum aprendizado de situações trágicas como essas, mas outras (talvez a maioria) são destruídas e definham por dentro, nunca se recuperando.

Enquanto posso aceitar que crescemos e aprendemos com o sofrimento e com a dor, não posso aceitar uma religião que ensine que essa é a razão pela qual sofremos na vida. O grande problema com esse pensamento é que se tudo que ocorre tem uma razão de ser, então não há nada bom nem mau, e tudo é moralmente neutro. Não posso aceitar que a violência cometida contra uma pessoa ou contra um povo seja útil nem, especialmente, que seja o plano de um Deus inteligente e benevolente.

A coisa mais patética a respeito dessa forma de pensar é que ela culpa a vítima pelo que lhe ocorreu. A vítima da tragédia é culpada porque se ela tivesse sido mais inteligente, teria aprendido a vontade divina antes, e não precisaria passar por aquilo!

Às vezes, alguns aparecem com uma visão que parece ser mais sofisticada, dizendo que a razão para passarmos por sofrimento aqui é porque devemos ter feito algo errado numa vida passada. Esse pensamento os ajuda a manterem a ideia de que o mundo é justo e perfeito. Eu, entretanto, não acredito que o mundo seja justo nem perfeito. Desastres naturais acontecem. Pessoas boas adoecem e morrem.

Desastres naturais acontecem, por exemplo, porque é desta forma que o universo físico está estruturado, e não porque as pessoas que morreram nesses desastres mereciam morrer dessa forma, ou porque as pessoas que ficaram precisavam aprender uma lição. Pessoas morrem em decorrência de doenças porque nossos corpos físicos são mortais, limitados, e eventualmente desfalecerão, morrerão, e se desfarão em pó, e não porque seja um plano de Deus para ensinar aos sobreviventes uma lição. Eu não posso aceitar um Deus que ensine lições por meio do assassínio de crianças e adultos. Não posso apreciar uma religião que ensine ideias horríveis como essas.

Ao conversar com pessoas que acreditam nessas coisas, tenho o desejo de ajudá-las a abrirem suas mentes e tentarem enxergar um metro à sua frente. E oro para que usem o intelecto e a liberdade com os quais foram abençoadas para sonharem, viverem, sofrerem e mesmo morrerem de maneira mais digna.

+ Gibson

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

Meu encontro com o Divino

Muitos falam como se Deus devesse ser buscado em milagres espetaculares que abalam o mundo. Eu, entretanto, encontrei-o no sorriso duma criança no parque, no vento que derruba as folhas secas das árvores, na música que envolve-me com sua melodia inebriante. Não, não que Deus não possa ser encontrado em milagres, ele certamente o é. No milagre da alegria diante das coisas mais simples e comuns da vida. No milagre do êxtase que toma conta de dois amantes em seu momento mais íntimo. No milagre do raciocínio que nos leva a fazer o bem em nossas vidas diárias. No milagre do sentir-se encantado pela própria vida. Lá encontrei o milagre. Lá encontrei o Divino!