A coisa
mais triste a respeito do período eleitoral – e, em minha
experiência, isso vale tanto para o Brasil quanto para os EUA – é
que a inteligência de militantes partidários parece entrar em
hibernação. Frequentemente, parece haver uma explicitação de
incoerências entre o que geralmente afirmam, em outros momentos, e
aquilo ou aqueles que tão vorazmente defendem em sua tola militância
partidária.
Bem, como
não devo favores políticos a absolutamente ninguém, me permitam
ousar dizer o que penso sobre essa hibernação da inteligência
militante. Utilizarei o padrão da língua portuguesa e, todos os
pronomes, substantivos, adjetivos etc que aparecerem em sua forma
masculina também se referem ao feminino.
Para
iniciar, é importante deixar claro que, com a idade, background
sociocultural, experiência de vida e formação que tenho, não
acredito em heróis. Nenhum homem ou mulher que ocupe uma posição
política é um herói ou salvador da pátria. No máximo, admiro uma
certa posição política num dado contexto. Nem mesmo os autores
filosóficos que me influenciaram, por exemplo, são ídolos
intelectuais que reverenciaria de forma absoluta. Para mim, todos os
“heróis” políticos têm pés de barro.
Isso já
é suficiente para me separar desses ativistas que posam como
intelligentsia política, afirmando sua religião civil, com
seus dogmas políticos sacrossantos, seus rituais revolucionários e
suas divindades partidárias (ao mesmo tempo em que, geralmente,
condenam as pessoas que professam uma fé religiosa como se essas
fossem seres irracionais e ignorantes).
Esses
militantes partidários são os que idolatram certos personagens
políticos nacionais ou d'alhures, colocando-os sobre altares, onde
devem estar intocáveis. Esses ídolos políticos passam, então, por
um processo de sacralização ainda em vida, e seus dizeres –
independentemente de quão absurdos sejam – passam por um rápido
processo de canonização e se tornam dogma da “religião civil”
que esses ativistas partidários constroem.
A esta
altura, já imagino que tenham dado uma face ao meu comentário (é...
se você for um partidário do establishment do dia no Brasil,
deve ter se ofendido e imaginado que me refiro a Lula da Silva). Bem,
se a carapuça serviu, então que seja! Mas não me refiro apenas a
ele, nem apenas ao Brasil. Abraham Lincoln, Getúlio Vargas, John F.
Kennedy, Fidel Castro, Che Guevara, Ulysses Guimarães, Fernando
Henrique Cardoso, Hugo Chávez, George W. Bush, Barack Obama, Dilma
Rousseff, Eduardo Campos, Marina da Silva, Aécio Neves... escolha
você mesmo um nome! Todos eles podem estar – e, de facto, estão –
sobre o altar de algum devoto partidário.
Bem, se
você já se irritou com minha metáfora religiosa, dê-me um
desconto. Não consigo subtrair minha formação teológica da
linguagem que escolho utilizar para falar daquilo que vejo como uma
“religião civil”. Como um teólogo liberal, e como um ministro
unitarista, frequentemente critico o dogmatismo cego. Então, você
não pode esperar que não criticaria o dogmatismo cego da “religião
civil” também.
Voltando
ao fanatismo – não, me desculpem, à “hibernação da
inteligência” – dos militantes partidários, lembrem-se do que
tem ocorrido nos últimos doze anos no Brasil e nos últimos oito
anos em Pernambuco.
O Brasil
tem sido governado pelo PT desde 2003. O executivo federal tem
contado com uma esmagadora aliança no Congresso Nacional, e nos
governos e legislaturas estaduais. Os vassalos dos partidos de base
dominam as estruturas da máquina pública, dos sindicatos e dos
chamados movimentos sociais. Ou seja, o PT e seus aliados reinam
quase que absoluta e inquestionavelmente. Mesmo que minha afirmação
lhes irrite, isso é um fato.
Agora,
pode realmente alguém, em sã consciência, acusar a inútil,
ineficiente e patética “oposição” – na verdade, eles nem são
dignos dessa alcunha – como os “culpados” pelo que não
funciona no país? Que tipo de cegueira estúpida encobre a visão
desses militantes partidários?
Só para
que se recordem, quem governava o Brasil durante as últimas greves
dos diferentes grupos de servidores federais? Eram os
“conservadores”, a “direita”, os “fundamentalistas”? Bem,
se você também vive no Brasil, terá de concordar comigo e
reconhecer que era Dilma Rousseff, com o PT e seus aliados. E se você
vive em Pernambuco, terá de reconhecer que nas últimas greves de
diferentes grupos de servidores estaduais, era Eduardo Campos (ou seu
substituto de última hora), com o PSB (que, na prática, era ele
mesmo) e seus aliados.
A
crítica, aliás, se estende aos governadores daquilo que por aqui
chamam equivocadamente de “direita”, isto é o PSDB, e seus
aliados do DEM; assim como de todos os outros partidos nacionais. Se
me referi diretamente ao PT e ao PSB, é pelo simples fato de o
Governo Federal estar com o PT há três mandatos, e o estadual em
Pernambuco estar com o PSB há dois mandatos.
Como os
militantes de todos esses grupos podem, honestamente, falar em
“mudança”, em “será melhor” etc, quando esses partidos e
aliados, e seus candidatos, estão no poder há tanto tempo e, na
prática, sem oposição? Quem pode ser tão estúpido a ponto de não
perceber que há algo errado na narrativa histórica feita por esses
grupos de militantes partidários (de absolutamente todos os
partidos)?
Recentemente,
li comentários de treze pessoas afirmando que eu estava distorcendo
a história quando sarcasticamente postei em minha conta do
Twitter: “Em 2013, incendeiam o país protestando contra a
corrupção; em 2014, fazem propaganda gratuita p/o Governo
protestado... Quem entende isso?”
Obviamente,
não podia escrever mais que “contra a corrupção” em minha
postagem, já que os limites do Twitter não permitiriam mais
palavras. Os que se doeram com meu comentário eram militantes da
“religião civil” do establishment. Eu, obviamente, havia
ofendido a sacralidade de seus ídolos e de seus dogmas. Sua
inteligência, aparentemente, fora atingida pelo estado de hibernação
do período eleitoral.
Quando,
em 2013, o populacho saiu às ruas para “protestar” (e destruir,
e queimar, e roubar, e violar direitos, e desobedecer às leis, e
desrespeitar a Constituição Federal, etc, etc, etc), contra quem
protestavam? Contra alguma entidade imaginária ou contra quem
detinha o poder? E quem detinha o poder? Se queriam mais “educação
e saúde” e não a “Copa”, contra quem protestavam? Se queriam
mais ações governamentais em nome dum “bem-estar social”,
contra quem protestavam?... Bem, os militantes que me enviaram
mensagens pensam que protestavam contra todos menos os seus
respectivos partidos políticos! Não é brilhante isso?!... Para
essas pessoas, eu sou ou um ignorante ou um manipulador à serviço
“da direita”!... Bravo para eles! Não imaginam o quão
envergonhado me sinto por sua letargia cognitiva!
Esses
militantes da “religião civil” brasileira são os mesmos que
exigem a punição dos envolvidos com a violência da ditadura
anuladora das liberdades individuais, como a expressão de opinião,
ao mesmo tempo em que exigem a criação de leis que limitariam a
liberdade da imprensa que ousa opinar (independentemente do valor de
sua opinião) contra as divindades partidárias. Curioso, não?!...
Talvez, a melhor classificação para a atitude desses serviçais do
Poder seja: HIPOCRISIA. Pura e simples!
O que
essa gente não parece compreender é que os governantes e
legisladores não nos fazem favores quando realizam obras de qualquer
natureza – nas áreas de educação, saúde, segurança, cobertura
social etc. Eles simplesmente cumprem a lei – isto é, quando o
fazem. Assim, um partido político e um governante não são
patriarcas da moralidade; eles são servidores dos cidadãos. Mesmo
que, em meu caso, não se tenha votado em quem governa, a partir do
momento em que ele ou ela sobe ao poder, estará lá para servir-me
enquanto cidadão – e não apenas aos adeptos de sua “religião
civil”. Logo, não fazem nada mais além de cumprir com sua
obrigação constitucional.
É uma
pena que esses militantes – isto é, aqueles que servem
entusiasticamente como serviçais gratuitos da máquina eleitoral –
não se deem conta das bobagens que gritam por aí, e do papel de
tolos que fazem em nome de gente sedenta pelo poder!
+Gibson da
Costa