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quarta-feira, 16 de setembro de 2009

O que significa "Amar a Deus"?


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Uma resposta à Maria C.

Querida Maria C.,

Você falou em duas de suas mensagens a respeito da obrigação que os cristãos têm de “amar a Deus”, e disse que isso se demonstra através de nossa obediência aos mandamentos do mesmo Deus. Você ainda deixou claro que fazia aqueles comentários por pensar que cristãos como eu, que reinterpretam a tradição cristã, rejeitam, de alguma maneira, os mandamentos de Deus e, dessa forma, demonstram que não o amam.

“E ame o Senhor seu Deus com todo o seu coração, com toda a sua alma, com todo o seu entendimento e com toda a sua força.” (Marcos 12:30)

De acordo com o Evangelho, Jesus reafirmou isso aos seus compatriotas e seguidores. Ele reafirmou algo que era ensinado há séculos e séculos em sua tradição religiosa, o judaísmo. E a tradição cristã tem dado voz a esse ensinamento durante toda a sua história, apesar de nem sempre ser com os melhores exemplos práticos.

A minha pergunta é: Afinal de contas, o que significa “amar a Deus”? Como você acha que demonstramos nosso amor a Deus?... Aparentemente, a sua resposta é simples: obedecer aos mandamentos de Deus. Mas que mandamentos são esses?

Eu gosto da resposta dada por Jesus nessa mesma passagem de Marcos (leia Marcos 12:28-31), quando ele reafirma que os dois maiores mandamentos são o amor a Deus e o amor ao próximo. Para mim, fica claro que “amar a Deus” é simplesmente amar aquilo que Deus ama, é se importar com aquilo com o qual Deus se importa, é cuidar daquilo que Deus criou e cultiva. Por que “amar ao próximo” é tão importante quanto “amar a Deus”? Porque é simplesmente impossível “amar a Deus” sem amar aquelas pessoas que são, isso é, que existem, por causa de Deus (independentemente de nossa compreensão do nome “Deus”), que carregam em seu próprio ser as marcas de Deus. Se a mensagem cristã afirma que “Deus é amor”, não se pode conhecer – e, consequentemente, amar a Deus, sem que se “pratique” Deus (isto é, sem exercer o amor!).

No espírito da mensagem cristã encontro quatro afirmações básicas a respeito da humanidade: 1) ela foi criada por Deus; 2) os homens e mulheres são filhos e filhas de Deus; 3) a humanidade é amada por Deus; e 4) a humanidade é aceita por Deus.

Como cristão, quando olho para as outras pessoas é isso que eu vejo. Eu vejo indivíduos que têm uma origem divina, já que sua origem está naquela mesma Realidade que é o centro de minha visão religiosa. Por esses indivíduos terem sua origem em Deus, também reconheço o fato de Deus – essa Realidade que não me atrevo a tentar definir – ser o Pai ou a Mãe dessas pessoas, e que por essa razão, Deus os ama e os aceita plenamente.

Só que a criação de Deus não é expressa apenas pela humanidade. Como cristão, afirmo que o próprio universo é criação de Deus. Se o universo é criação daquela Realidade, é também seu filho, e meu cuidado, atenção, e amor, deve se estender ele. Se eu destruo, desnecessariamente, uma parte da vida deste planeta para construir um parque aquático, eu estou demonstrado que não amo aquilo que Deus ama. Se eu saio para fazer caçadas, pelo simples prazer de me divertir com a morte de criaturinhas indefesas, não estou demonstrando amor para com o objeto do afeto de Deus. Se apoio a ideologia da violência e da guerra, da exploração de seres humanos, da destruição do meio ambiente, se viro as costas àqueles que são pisados e humilhados, se me calo quando deveria abrir minha boca contra os barões deste mundo, eu estou demonstrando minha falta de atenção, cuidado, e amor para com aquilo que representa o objeto do afeto de Deus (para usar uma linguagem um tanto poética).

É muito simples falar em amor a Deus como sendo uma renúncia às coisas deste mundo, criando-se listas daquilo que representariam essas coisas. Você se junta a um grupo cristão, e de repente te dão uma lista de “pecados” aos quais se deve renunciar para que você seja capaz de demonstrar seu amor a Deus. Mas amar alguém (ou alguma coisa) não é apenas um “não fazer”, constitui também “um fazer” - ao menos, em minha visão de “amor”. Nos preocupamos tanto com listas de “não fazer” por ser mais conveniente do que nos preocuparmos com a lista de “fazer” - na realidade, quando se trata de relacionamentos, e não seria diferente com Deus, não há uma lista do “fazer”, mas uma lista do “se envolver”. É mais fácil abrir mão de um hábito social do que se engajar de corpo e alma no cuidado a alguém ou alguma coisa – e esse engajamento de corpo e alma com as coisas que são importantes para Deus (de acordo com o que foi proclamado pela tradição bíblica) é a maior e melhor demonstração do que seja “amar a Deus” em minha visão de mundo.

Paz!

+Gibson

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Sugestão de Leitura - Setembro de 2009

Gostaria de me desculpar com meus amigos aqui, a quem prometi fazer sugestões de leituras mensalmente. Tenho estado muito ocupado nos últimos meses, e por esta razão não tenho escrito para meu blogue com tanta frequência.


Este mês, gostaria de sugerir um livro do qual gosto muito, e cuja autora já conheço há alguns anos. Irshad Manji, autora de minha recomendação do mês de setembro, é uma muçulmana que se sentiu excluída por uma cultura opressiva e, mesmo assim, decidiu redescobrir o Islã. O resultado disso é o livro que escreveu – cujo título recebeu uma tradução um tanto problemática em português para alguns (“Minha Briga Com o Islã”), já que o título original é “O Problema com o Islã – O Clamor de Uma Muçulmana por Reforma em Sua Fé”. Irshad Manji lidera hoje um dos muitos movimentos pelo retorno à tradição do Ijtihad (uma livre interpretação da fé islâmica) – o tema que tem sido de meu interesse há muitos anos (já que tenho muitas ligações com a tradição islâmica, por muitas razões).


Então fica a sugestão:


Manji, Irshad. Minha Briga com o Islã – o Clamor de uma Mulher Muçulmana Por Liberação e Mudança. Editora Francis, 2004. ISBN: 9788589362542

Disponível na Livraria Cultura online: http://www.livrariacultura.com.br/scripts/cultura/resenha/resenha.asp?nitem=783494&sid=9881281961191602751623032&k5=25C9CB1&uid=


Uma Comparação Simplista Entre as Crenças Unitaristas Com a de Outros Cristãos

DEUS


Outros Cristãos: três pessoas, conhecidas como Pai, Filho, e Espírito Santo; ideia que deve ser aceita pela fé e é conhecida como o Dogma da Trindade; é vingativo e amoroso, ao mesmo tempo; é um ser supremo, e talvez em forma humana; deve ser satisfeito pelo sacrifício de Jesus Cristo na cruz; da forma descrita anteriormente, é uma concepção cristã; se torna conhecido ao homem através da terceira parte da Trindade, o Espírito Santo.


Unitaristas: Os cristãos unitaristas estão abertos a múltiplas interpretações teológicas a respeito de Deus; Deus é amor; é espírito; não precisa ser satisfeito; é o Deus de todas as pessoas; se torna conhecido a todos por meio de suas experiências pessoais, sociais, e religiosas na vida.


JESUS


Outros Cristãos: é Deus, a segunda pessoa da Trindade; é o Salvador de todos os que acreditam nele; pode vir de novo em pessoa; foi ressuscitado física ou espiritualmente e ascendeu ao céu.


Unitaristas: foi um homem – um gênio religioso; foi um mestre e um exemplo da boa vida; ensinou princípios de verdade eterna, das quais o mundo ainda precisa; proclamou uma mensagem que nos influencia ainda hoje.


A HUMANIDADE


Outros Cristãos: nasce no pecado, pois sua natureza herdade é má e depravada; precisa ser salva por meio da aceitação pessoal de Cristo, um Salvador-Deus, dado como o filho unigênito de Deus para pagar pelos pecados da humanidade; nasce para glorificar a Deus, para fazer sua vontade Divina e para trazer os pecadores a “Cristo”.


Unitaristas: nasce sem pecados; apesar de nascer sem pecados, adquire a capacidade tanto para o bem quanto para o mal, mas nunca está eternamente perdida; “salvação” pessoal é uma questão de crescimento e desenvolvimento social; está aqui para construir o Reino de Deus, ou seja, a boa sociedade, reconhecendo os laços da humanidade.


A VERDADE


Outros Cristãos: encontra sua base na Bíblia e/ou nos dogmas da igreja.


Unitaristas: é encontrada em todas as experiências humanas; é descoberta na busca e raciocínio de todas as pessoas.


A BÍBLIA


Outros Cristãos: é a Palavra de Deus revelada, inspirada pelo Espírito Santo e frequentemente considerada como fonte suficiente do que se precisa saber para alcançar a salvação; está aberta a interpretações, mas em geral deve ser aceita como a “Santa Palavra” de Deus; é a fonte autorizada de verdade religiosa revelada por Deus e essencial para a “salvação”; pode antever o futuro da existência da humanidade e o fim do mundo.


Unitaristas: é uma coleção de livros que registram o crescimento moral e religioso de dois grupos de povos (os antigos hebreus e os primeiros seguidores de Jesus de Nazaré); é uma narrativa franca das variadas experiências de um povo no decorrer de sua história; é uma das várias fontes de valores éticos e religiosos; registra as várias ideias de um povo particular a respeito da vida aqui e no porvir.


O REINO DE DEUS


Outros Cristãos: chegará através da miraculosa vinda de Cristo no fim do mundo; é concebido como sendo plenamente possível apenas na vida futura; será futuramente governado por Deus em benefício daqueles que tiverem sido “salvos”.


Unitaristas: é alcançado por meio dos esforços humanos; é concebido como sendo plenamente possível aqui na terra; será compartilhado por todas as pessoas.


PECADO


Outros Cristãos: é herdado por todas as pessoas como parte de sua natureza; será punido em algum estado futuro.


Unitaristas: é a rejeição deliberada da humanidade de fazer o bem; carrega sua própria punição.


A IGREJA


Outros Cristãos: é o meio básico de salvação; é a Santa Instituição.


Unitaristas: é uma comunidade unida em favor do crescimento moral e espiritual e uma escola de religião; é um grupo de pessoas organizadas para adorar a Deus e para servir a humanidade.


A IMORTALIDADE


Outros Cristãos: é um lar no céu onde o espírito humano individual vive para sempre.


Unitaristas: é uma ideia aberta à interpretação e aceitação pessoal.


A ORAÇÃO


Outros Cristãos: é uma comunicação e uma comunhão com Deus, que é concebido como sendo um ser sobrenatural que pode mudar a ordem natural do universo em favor da humanidade.


Unitaristas: é uma expressão dos pensamentos, sentimentos e aspirações mais profundas de alguém, uma tentativa de conhecer o certo e fazê-lo.


OS SACRAMENTOS


Outros Cristãos: para alguns, são dois, para outros, são sete; poder sobrenatural se faz presente em cada um deles, por virtude da presença do Espírito Santo.


Unitaristas: ordenanças não são consideradas como sendo mágicas; são símbolos humanos, criados para ajudar uma pessoa em sua busca pela boa vida.


NOTA: Como explicado no próprio título, esta comparação é muito geral e deveras simplista a respeito das crenças de outros cristãos e de cristãos unitaristas. Preparei esta lista apenas como uma forma didática (muito simplista e limitada) para ajudar a responder algumas perguntas que me são feitas com muita frequência pelos leitores deste blog.


+Gibson