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quinta-feira, 4 de agosto de 2011

As crenças unitaristas e a linguagem litúrgica


Algumas perguntas me foram feitas acerca da liturgia na Congregação Unitarista de Pernambuco, e as respostas que dei àquelas perguntas me parecem apropriadas para uma discussão mais ampla acerca da compreensão litúrgica do Cristianismo Liberal como um todo.

Expliquei à pessoa que me questionara que nossa liturgia – assim como a liturgia de toda comunidade de fé – baseia-se em nossas compreensões teológicas (e filosóficas). A compreensão mais amplamente aceita em nossa comunidade é a de integridade. Nossas palavras e ações litúrgicas devem ser um reflexo da integridade de nossas crenças – que, em nosso caso, como teologicamente liberais, não estão acorrentadas ao dogma nem à tradição; nossas crenças são abertas à mudança.

Podemos pensar em, pelo menos, quatro princípios que nos guiam em nossas práticas litúrgicas:

1 – Nosso foco é um modus vivendi compassivo, e não crenças dogmáticas. A compaixão, que, para nós unitaristas, é a verdadeira religião (Miqueias 6:8; Tiago 1:27), faz-nos afirmar o valor e a dignidade de todos os seres humanos (Mateus 7:1-2; 25:37-40). A integridade que afirmamos exige que essa compaixão – esse amor, essa caritas – se expresse em nossas palavras e ações não apenas em nosso dia a dia, mas também em nossa liturgia na igreja. Logo, linguagens sexistas, racistas, homofóbicas, tribalistas, nacionalistas, violentas etc, não podem ser parte de nossa liturgia. É por esta razão que recusamos ler em nossas liturgias mesmo trechos das Escrituras que entendamos como exibindo tal tipo de linguagem.

2 – A maioria de nós unitaristas não compreende Deus como um ser sobrenatural que intervem na história humana. Há alguns de nós que certamente entendem Deus da maneira dita “tradicional”, mas a maioria de nós entendemos a Divindade como uma metáfora para os mais profundos valores humanos. A integridade que buscamos exige que sejamos cuidadosos e inclusivos para com todos em nossa liturgia; logo, nossa linguagem litúrgica tem de ser sensível às compreensões de todos os que fazem parte desta comunidade e que oram conosco.

3 – Para a maioria de nós unitaristas, Jesus é um mestre e um exemplo, e não um salvador sobrenatural enviado por Deus. Jesus “salva-nos” por meio de seus ensinamentos, e não por meio de uma morte para pagar por nossos “pecados”. Por causa disso, não fazemos uso dos tradicionais hinos cantados por outras igrejas cristãs – já que os mesmos estão moldados pela teologia da redenção; somos forçados por nosso anseio pela integridade a encontrar outras vozes para a nossa fé. Essa é a razão para a grande diferença musical em nossa comunidade – quando comparada a outras igrejas cristãs.

4 – Para nós unitaristas, o cristianismo não é o único caminho aceitável e autêntico para se chegar ao Divino ou para encontrar sentido na vida. A integridade que buscamos força-nos a honrar os caminhos que para outras pessoas são tão verdadeiros quanto o nosso é para nós próprios. Isso, mais uma vez, faz-nos rejeitar hinos ou afirmações que insinuem uma superioridade cristã em relação a outras pessoas, por exemplo.

O que nós unitaristas cremos, em essência, é que – mesmo fazendo uso de linguagem metafórica, muitas vezes – nossa linguagem litúrgica, que se expressa em palavras e atos, deve refletir nossas crenças; e essas crenças, em nosso caso, incluem a crença no valor e dignidade inerente de todos os seres humanos (homens, mulheres, de todos os gêneros e identidades de gênero, e de todas as orientações emociono-sexuais), uma crença na paz, na liberdade de pensamento, no exemplo deixado pelas palavras e ações atribuídos a Jesus de Nazaré – nosso mestre e modelo.

5 comentários:

  1. Estimado Rev. Gibson

    Eu sou um baiano da cidade de Salvador. Fui um adventista do sétimo dia durante toda a minha infância e parte da minha adolescência, entretanto aos 14 anos de idade, após iniciar um período de reflexão sobre os pressupostos de crença que eram utilizados pelo adventismo, começou a nascer em minha pessoa um forte desejo de descobrir qual era a verdade por trás de minha tradição religiosa. Após uma longa jornada da qual ainda me sinto como que empreendendo-a cheguei à conclusão de que simplemente não acreditava nem em metade dos pressupostos que sustentavam as crenças e práticas do adventismo. A partir desse momento eu simplemente abandonei-o e busquei um caminho que me parecia ser o mais sensato aos meus olhos e qual não foi minha surpresa ao encontrar com o unitarismo universalista, sou grato ao unitariamos por me proporcionar o arcabouço de reflexões e tolerância que eu precisava para minha vida. Sinto muito por não haver uma igreja UU aqui em Salvador, mas acredito que esse pode ser o início de uma empreitada majestosa para trazer o UU para cá, espero poder ajudar a tornar isso possível um dia.

    Um carinhoso abraço e obrigado pelas suas palavras sabias palavras nesse site.

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  2. Estimado Rev. Gibson

    Eu sou um baiano da cidade de Salvador. Fui um adventista do sétimo dia durante toda a minha infância e parte da minha adolescência, entretanto aos 14 anos de idade, após iniciar um período de reflexão sobre os pressupostos de crença que eram utilizados pelo adventismo, começou a nascer em minha pessoa um forte desejo de descobrir qual era a verdade por trás de minha tradição religiosa. Após uma longa jornada da qual ainda me sinto como que empreendendo-a cheguei à conclusão de que simplemente não acreditava nem em metade dos pressupostos que sustentavam as crenças e práticas do adventismo. A partir desse momento eu simplemente abandonei-o e busquei um caminho que me parecia ser o mais sensato aos meus olhos e qual não foi minha surpresa ao encontrar com o unitarismo universalista, sou grato ao unitariamos por me proporcionar o arcabouço de reflexões e tolerância que eu precisava para minha vida. Sinto muito por não haver uma igreja UU aqui em Salvador, mas acredito que esse pode ser o início de uma empreitada majestosa para trazer o UU para cá, espero poder ajudar a tornar isso possível um dia.

    Um carinhoso abraço e obrigado pelas suas palavras sabias palavras nesse site.

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  3. Caro Ítalo,

    Todos nós passamos por jornadas espirituais contínuas. Penso na fé como uma jornada e não como um destino final; logo, minha compreensão teológica está (espero) num contínuo processo de mudança. Nesse ponto, temos um caminho comum, e o Unitarismo parece ser sempre um lar para pessoas que queiram embarcar nesta jornada de busca.

    Sim, concordo com você. Espero que sua própria busca possa ser o início do espírito unitarista ou unitário-universalista por aí. Conte com meu apoio para qualquer coisa.

    Grande abraço!

    +Gibson

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  4. Embora eu tenha demorado para ler a publicação desse comentário, bem como o comentário do reverendo, fiquei muito contente ao entrar novamente e poder vê-los aqui. Eu certamente espero ser um meio pelo qual o unitarismo possa iniciar sua história aqui em Salvador e acredito que contar com sua ajuda será algo muito precioso. Meu encantamento pelo unitarismo veio através da leitura do livro "Um Novo Cristianismo para um novo mundo" do Bispo Spong. Esse como acredito que já deva ter lido é uma palestra que ele (Spong) pronunciou em Harvard e foi simplesmente um divisor de águas na minha vida e sou imensamente agradecido a Ele por ter me apontado uma direção.

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  5. Caro Ítalo,

    É impressionante o impacto que esse livro do Bispo Spong tem tido em muitos de seus leitores aqui no Brasil. O número de pessoas que buscam uma outra alternativa ao "cristianismo tradicional" que conheciam depois de ler aquele livro é grande, pelo menos ao julgar pelas pessoas que buscam os unitaristas aqui.

    Como um cristão, não me importa muito que seja em minha comunidade (a unitarista, isto é) que "buscadores" sinceros como você encontrem um lar. A única coisa que me importa é que possam encontrá-lo. Que a "igreja" - a comunidade cristã - seja sufientemente ampla para receber a todos os que queiram nela encontrar esse lar. Entretanto, se outras famílias cristãs não o puderem fazer, nós - os unitaristas - temos nossas mentes, corações e braços abertos!

    +Gibson

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