Sempre me
aborreço com a maneira como somos semanticamente descuidados em
nossas discussões. Para dar um exemplo, pense no uso que
recorrentemente fazemos hoje de expressões como “fundamentalismo”,
“ideologia”, “capitalismo”, e “neoliberalismo”. Para mim,
nem sempre é muito claro o que esses termos significam no discurso
da maioria daqueles que os utilizam. Eles se tornaram “chavões”
discursivos que significam quase qualquer coisa nos discursos
políticos e acadêmicos, apesar de, na história intelectual, terem
significados específicos.
Talvez
minha quase-obsessão semântica seja um mal advindo de minha
formação clássica e teológica. Como alguém que se ocupa do
estudo histórico de ideias religiosas, tenho que manter em mente o
sentido que determinados termos possuem nos textos que analiso.
Assim, relações intertextuais são indispensáveis ao meu campo de
análise. Não posso, por exemplo, utilizar o termo “fundamentalismo”
para me referir a movimentos reformistas na Europa do século XVI, e
achar que não há nenhum problema com isso! Considero que viver numa
era na qual não há mais noções de objetividades existenciais, na
qual não há mais verdades inquestionáveis, exige um cuidado
semântico maior para que possamos manter um certo nível de
inteligibilidade. Infelizmente, nem todos compreendem isso.
A
plasticidade idearia que invadiu o domínio semântico é tão
assustadoramente “descontrolada” que tenho quase certeza que
nossos antepassados teriam um grande problema para nos entender –
não apenas por usarmos uma linguagem diferente, mas porque aquelas
antigas noções que lhes ofereciam um senso de segurança e unidade,
e que se manifestavam em termos plenos de sentido, não significam a
mesma coisa (quando significam algo!), e seu uso não segue a nenhum
padrão de significado que possa ser plenamente partilhado por todos
os interlocutores.
Vindo dum
teólogo que se preocupa com a relação entre a fé e a linguagem
metafórica, esse apego à clareza semântica pode parecer
contraditório – já que, para mim, a fé (o texto) só pode ser
compreendida em relação às construções subjetivas do sujeito
(i.e., relações intertextuais). Mas minha consideração de
subjetividades individuais só são possíveis porque conceitos, em
seus contextos históricos, são essenciais para a construção
exegética. Então, talvez a confusão semântica seja indispensável
ao domínio literário, mas podemos dispensá-la quando nos referimos
a uma tentativa de construir uma compreensão do domínio das ideias:
seja na teologia, na filosofia, na história, na sociologia etc. A
clareza semântica é essencial para a construção teórica e,
consequentemente, para a eficiência metodológica.
+Gibson