Estamos em 2013, mas
tenho a impressão de que há um saudosismo extremado das décadas de
1960 e 1970 na mente de muitos. O Brasil não vive mais um regime
ditatorial. As pessoas podem quase que dizer tudo o que pensam –
claro, se elas não agridem a sensibilidade de correção política
de multiculturalistas pós-modernos, dos crentes no messianismo
vétero-marxista ou no salvacionismo neo-socialista etc. E, mais
importante ainda para o que acontece hoje, os cidadãos podem
escolher livremente aqueles que os governarão e representarão
legislativamente.
Os cidadãos brasileiros
não são vítimas da incompetência e corrupção de seus
governantes e legisladores. Não! São cúmplices! Foram os cidadãos
que escolheram aqueles contra os quais supostamente protestam – se
bem que algumas mentes “esclarecidas” dentre eles dizem protestar
contra aquilo que chamam de “Direita”, como se o Brasil fosse
governado agora pelo DEM ou PSDB, grupos que são mais prontamente
identificados como essa entidade abstrata designada como “Direita”
(se bem que é bom reconhecer logo agora que sua atual minoria e
insignificância política, entretanto, não os absolve de sua culpa
passada no cenário Federal e, muito menos, nos variados cenários
municipais e estaduais presentes!). São esses cidadãos quem
legitimam a incompetência de muitos desses cretinos que extraem
benefícios do eleitorado, defendendo os interesses de todos, menos
de sua suposta “base” eleitoral.
Aqueles que protestam nas
ruas, e dentre eles, o populacho ensandecido que se auto-adjetiva
como “revolucionário” (vide discursos de “instruídos”
universitários que conclamam seus iguais à revolução nas redes
sociais), têm algum objetivo claro com seu movimento (que, sim, até
certo ponto – muito limitado, talvez – possui legitimidade
racional)? Ou estariam apenas sendo levados pela ânsia de
aproveitarem a presença maciça da imprensa internacional para
mostrarem que também podem ser “revolucionários”?
O fato é que vivemos
numa democracia – imperfeita, sim, mas uma democracia assim mesmo
–, num Estado Democrático de Direito. Isso exige um
comprometimento com as liberdades civis, independentemente de quão
insatisfeitos estejamos com a situação econômica, política ou
social. Como cidadão, como um Ministro religioso e como um educador,
tenho um compromisso com a Democracia e com o direito. É isso que
ensino a meus paroquianos e alunos. É nisso que acredito. É em
favor disso que voto. É isso que espero dos demais cidadãos, que
estão presos ao mesmo contrato constitucional que eu. Minha vida
como cidadão está comprometida com aqueles princípios
estabelecidos pela Constituição Federal. Assim, anseio pelos
direitos que possuo, mas também reconheço que estou preso a
deveres.
A Constituição
estabelece algumas coisas sobre as quais tenho pensado como
consequência do que tem ocorrido no Brasil nos últimos dias. Ela,
por exemplo, estabelece que “ninguém será obrigado a fazer ou
deixar de fazer alguma coisa senão em virtude da lei”, e que “é
livre a locomoção no território nacional em tempo de paz” (Art.
5º). Comparando isso com as notícias disponíveis sobre os
“protestos” Brasil afora – nos quais algumas das liberdades de
outros cidadãos lhes são negadas –, me pergunto se poderíamos
confiar nessa empreitada nas ruas como um movimento “democrático”.
Que tipo de movimento “democrático” se empenharia em retirar de
outros cidadãos, que não compartilham de suas expectativas ou não
concordam com seus métodos – ou, quem sabe, simplesmente querem
voltar para casa depois de um dia de trabalho –, dois de seus
direitos constitucionais?... Minha ética democrática, os princípios
que regem minha vida social, cidadã e profissional, me obrigam a
responder esse questionamento com um simples: “nenhum”! Nenhum
movimento que se suponha democrático sabotaria princípios que
mantêm a própria Democracia de pé. Não me importa o quão
impopular seja minha compreensão de Democracia, e muito menos os
adjetivos comuns que aqueles que pensam como eu têm recebido dos
“iluminados” do mundo virtual. O meu único compromisso, neste
caso específico, é com o Estado Democrático de Direito.
Os noticiários já
veicularam o que pretendem fazer hoje aqui no Recife. O Jornal do
Commercio online, por exemplo, divulgou ontem à noite o seguinte:
“O percurso só será
definido de última hora pelas lideranças do movimento, mas os
destinos mais prováveis são Marco Zero, pela Avenida Conde da Boa
Vista, ou Centro de Convenções, sede provisória do governo do
Estado, pela Avenida Agamenon Magalhães. Grupos se articulam para ir
juntos ao Derby, saindo dos quatro cantos da cidade e de outros
municípios do Grande Recife. Pelas redes sociais, ao menos 4 mil
pessoas prometem se encontrar às 14h no cruzamento entre a Avenida
Rui Barbosa e a Rua Amélia, nas Graças, Zona Norte.
Membro do Diretório
Central dos Estudantes (DCE) da Universidade Católica de Pernambuco
(Unicap) e integrante da Frente de Luta pelo Transporte Público, o
estudante Pedro Josephi diz que a manifestação principal será a
saída do Derby, mas que haverá ativistas posicionados
estrategicamente em alguns Terminais Integrados (TIs) do Recife. “Não
podemos revelar todos os direcionamentos, mas faremos outras ações,
como barricadas nos TIs. São várias frentes de atuação”,
afirma.”
(http://jconline.ne10.uol.com.br/canal/cidades/geral/noticia/2013/06/19/uma-quinta-feira-para-ficar-marcada-na-historia-do-recife-87203.php)
Não preciso comentar o
pequeno trecho acima. A atitude dos supostos “organizadores”
demonstra onde não está seu compromisso – não está com o
direito alheio, logo, não está com a Democracia.
O mesmo artigo acima,
termina da seguinte forma:
“[...] Diante do temor
de o protesto pacífico descambar para atos de vandalismo, como
ocorreu noutros locais, empresas, comércio, escolas e universidades
reduziram o expediente. A Secretaria de Defesa Social (SDS) alerta
que pessoas podem se infiltrar na multidão para depredar o
patrimônio público. Mas o movimento garante que o pacifismo é
bandeira de que não abrem mão. Tanto que a concentração se dará
diante do Comando-Geral da Polícia Militar.”
E, acompanhando o que
divulgavam nas redes sociais, encontrei esta pérola digitada por um
estudante de curso de Licenciatura em História (sim, um possível
futuro professor!) de uma Universidade Federal em Recife:
“Gostaria de informar
pra os "pacifistas" de plantão que na história, a única
revolução que foi vitoriosa sem violência aconteceu na Índia. E
ainda assim o sangue de muitos manifestantes escorreram pelas ruas. E
outra coisa, x9 tem vida curta...” [sic]
...Ele não só não
parece acreditar muito em ideias como paz e democracia, como acredita
estar iniciando uma “revolução”! É numa hora como essa que
tenho vontade de perguntar, junto com Paula Cole: “Where have all
the cowboys gone?”
O “movimento” parece
ser levado por uma crença em um mundo populado por bandidos e heróis
presa ao século passado. Não possui um objetivo claro. É
politicamente inconsistente. E não possui um compromisso com a ordem
democrática. É por essa e por outras razões que me recuso a
participar de toda esta loucura. Não poderia falar em Democracia se
contribuísse com essa incoerência pseudo-popular!
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