Recebi
cerca de vinte e-mails com comentários irritados sobre a imagem que
circula nas redes sociais sobre a pessoa “auto-crucificada” da
parada gay de São Paulo, ocorrida ontem. Para todos os que me
escreveram, um aviso: vocês provavelmente não ficarão
muito felizes com o que tenho a dizer!
Em
primeiro lugar, sou uma pessoa de fé. Mas minha fé, como bem sabem,
é moldada por uma mentalidade teologicamente liberal. Assim, apesar
de ser sensível às minhas próprias convicções teológicas, sou
também sensível à diversidade de compreensões que estão e devem
estar presentes nas relações humanas. Para mim, é necessário, às
vezes, me deslocar de minha posição de conforto, e tentar entender
as ações de outras pessoas do lugar onde elas estão. Em minha fé,
isso constitui um exercício espiritual.
Não
consigo entender por que a imagem de alguém que se figura como Jesus
crucificado, com um sinal acima de sua cabeça que indica sua
intenção – um protesto contra a homofobia que mata muitas pessoas
em todos os rincões do Brasil (e do mundo) –, causaria tanta
revolta. Afinal de contas, em culturas majoritariamente católicas,
como as brasileiras, a crucificação de Jesus foi
sempre utilizada como metáfora para representar aquilo que, na
compreensão cristã, o machucaria, o recrucificaria. Qualquer
cristão deveria poder facilmente relacionar a lembrança de que
pessoas são espancadas, humilhadas e mortas por conta de sua
orientação sexual, expressão de gênero, ou qualquer outra razão,
com as palavras de Jesus, quando disse que quando não
cuidássemos de nossos irmãos, era dele que não estaríamos
cuidando (Mateus 25:31-46).
Já
imagino a razão pela qual a encenação tem sido tão amargamente
criticada: a pessoa que interpretou Jesus e o evento no qual a cena
ocorreu!... A pessoa errada, no lugar errado! Essa é a única razão racionalmente justificável. Se a
encenação tivesse ocorrido num daqueles festejos carnavalescos, no
qual Jesus fosse representado por um homem “macho” bêbado, a
reação, provavelmente, teria sido menos revoltosa por parte,
especialmente, daqueles que ultimamente se redescobriram como cristãos
devotos preocupados com a moralidade sexual do mundo!
Não
posso deixar de pensar no mesmo Jesus tendo seus pés lavados por uma
mulher duvidosa; o mesmo Jesus comendo com pecadores; o mesmo Jesus
sendo tocado por mulheres e defendendo adúlteras; o mesmo Jesus que
escolheu como discípulo um cobrador de impostos para os dominadores
romanos; o mesmo Jesus que viveu sua vida rabínica a serviço dos
doentes espirituais. Eu não tenho nenhuma dúvida de que aquele
Jesus dos Evangelhos – não importando o quão historicamente
factuais ou não sejam os relatos a seu respeito – compreenderia a
mensagem daquela encenação.
Honestamente,
me sinto muito mais ofendido quando vejo Jesus ser retratado como um
cavaleiro do castigo divino, um general vingativo ou como um rei que
precise do dinheiro dos súditos para perdoar pecados!
Christe
Eleison!
+Gibson
Mto bom!
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