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terça-feira, 19 de setembro de 2017

Todas as pessoas

Ao longo de meu trabalho pastoral entre migrantes paralegais, desenvolvi um carinho especial pelas palavras das promessas que fazemos na Aliança Batismal. É verdade que aquelas palavras sempre foram muito importantes para minha espiritualidade, mas a convivência com a desumanidade da “fronteira” (um termo que uso com um sentido metafórico especial) as reveste dum significado renovado. Penso especialmente nas seguintes palavras:

[…]
Você buscará e servirá a Cristo em todas as pessoas, amando o seu próximo como a si mesmo?
Sim, com a ajuda de Deus.
Você trabalhará pela justiça e pela paz entre todas as pessoas, e respeitará a dignidade de todo ser humano?
Sim, com a ajuda de Deus.

Essas palavras exercem um poder convocatório sem igual. E, por serem parte da Aliança Batismal, carregam em si um senso de obrigatoriedade mais potente do que qualquer outra palavra sagrada em minha vida espiritual. Elas exigem, de mim, uma reflexão profunda sobre “todas as pessoas”, e sobre o que significa “servir”, “amar”, “trabalhar” e “respeitar” – os verbos que rezamos naquela Aliança.

O que fazemos daquelas palavras quando nos deparamos com os pecados etnocêntricos do tribalismo, do nacionalismo e do patriotismo? O que fazemos com aquelas promessas se e/ou quando decidimos fazer com que todos os povos se tornem discípulos de Cristo – o problemático convite feito pelo Cristo do Evangelho de Mateus 28:19-20? Até que ponto respeitamos “a dignidade de todo ser humano” quando esperamos que todos sejam como nós – ou quando supomos que Deus seja propriedade de nossa tradição religiosa?

Ou o que fazemos daquelas palavras quando nos calamos diante da injustiça e assistimos silenciosa e passivamente à violência perpetrada contra outros seres humanos, como o que ocorre contra grupos étnicos minoritários, refugiados e migrantes mundo afora? Ou quando nos calamos e não agimos quando atacam – em nome de qualquer Deus, homem ou nação – pessoas que abracem outras crenças religiosas, crença religiosa nenhuma ou certa ideologia política? Ou quando permitimos que, em nome de Deus ou da “nação”, pessoas tenham sua dignidade humana desrespeitada por qualquer motivo?

O que fazemos daquelas palavras quando sabemos que outras pessoas estão com fome na rua, e pensamos que não há nada de errado em comermos num restaurante caro, pois, afinal, isso é uma “questão de mérito”? Ou, ainda, o que fazemos daquelas palavras quando continuamos a votar em políticos corruptos que atentarão contra a “dignidade” humana dos demais membros de nossa sociedade ou de qualquer outra sociedade?

A verdade é que aquelas promessas são o maior desafio que nos podem ser feitos em nossa jornada espiritual. Elas são um testemunho de que a “fé cristã” exige ação no mundo: não ação para convencer ou converter pessoas, mas ação para curar e vivificar a vida humana.

+Gibson


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