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quinta-feira, 14 de junho de 2012

Sobre Deus


Tenho certeza que muitas pessoas gostariam que eu fosse mais objetivo em minhas respostas a certas perguntas que me fazem, especialmente quando o assunto tratado diz respeito à fé, a Deus, a certezas etc. A conversa se inicia mais ou menos assim:

Alguém: Você acredita em Deus?
Eu: Isso depende!
Alguém: Como assim? A resposta é simples: sim ou não!
Eu: A resposta depende do que exatamente você queira dizer com a palavra “Deus”.
Alguém: Não tente se esquivar da resposta. Você sabe o que quero dizer. Deus é Deus.
Eu: Não. Não sei o que você quer dizer. Você se refere a um Deus pessoal ou impessoal; a Deus enquanto um indivíduo ou a uma ideia; a um Deus distinto da criação ou a um Deus que se confunde com a criação; a um Deus que pode ser plenamente compreendido por teorias humanas, como credos ou declarações teológicas, ou a Deus que está além de nossa compreensão plena. Não, eu realmente não sei o que você quer dizer exatamente com a palavra ou nome “Deus”, logo, não posso dizer se acredito em Deus ou não...

E a conversa segue um caminho distinto, dependendo de com quem eu esteja conversando.

Claro que esse tipo de diálogo pode funcionar com aqueles que tenham uma mente um pouco mais inquisitiva e que não se sintam ameaçados quando defrontados com um desafio teológico/semântico; também, é óbvio que esse tipo de brincadeira provavelmente não funcionaria com a maioria das pessoas. Esse é o tipo de jogo que faço com jovens unitaristas, ou com meus alunos de Teologia, ou, ainda, com amigos mais próximos. Raramente costumo fazer joguinhos semânticos como esse com outras pessoas, por razões tão óbvias que não preciso explicar aqui.

A verdade é que posso soar, para algumas pessoas, como alguém obcecado com o uso (ou não) de certos termos para falar acerca de minha fé. No exemplo acima, temos dois termos problemáticos (no sentido de poderem representar diferentes coisas para diferentes pessoas, a ponto de mudarem por completo a impressão final em nossa conversa): acreditar e Deus.

O que exatamente as pessoas querem dizer quando me perguntam se acredito em Deus? Que sentido dão ao verbo acreditar, neste caso? O sentido é o de uma operação intelectual com a qual construiria ou abraçaria uma compreensão lógica do Divino? Ou se referem exclusivamente a minha própria experiência do Divino?

E o que dizer sobre o uso que fazem do nome Deus? Esse termo, em nossa língua, tem tantos diferentes sentidos que preciso de uma pista mais clara sobre o que se quer dizer com ele.

Não tentem me classificar como adepto desta ou daquela escola de pensamento simplesmente por dizer isso, mas – em se tratando do Divino – não acredito que tenhamos a capacidade de compreender plenamente uma Realidade que esteja além de nosso mundo objetivo. É óbvio que enquanto parte duma tradição que se define através de afirmações lógicas – como o Cristianismo –, faço uso das mesmas para articular minhas noções teológicas; isso é, em parte, o que estou tentando fazer agora. Entretanto, articular gnomas teológicas para discutir o Divino não é o mesmo que tentar definir a Deus em termos objetivos. Deus não é um objeto que possa ser colocado sob um microscópio, e que possa ser analisado como analisaríamos o interior duma célula. Deus é uma Realidade inesgotável dentro da qual somos (Atos 17:28). Na realidade, mesmo essa gnoma é problemática, pois se eu digo que Deus é, estou, na verdade, construindo limites existenciais para uma Realidade que supera minha capacidade de observação e, consequentemente, de compreensão. Aí reside o problema para se falar sobre Deus: nossos substantivos, nossos adjetivos e nossos verbos não são capazes de lidar com a abrangência de tal Realidade.

Deus não é uma propriedade desta ou daquela tradição teológica, religiosa ou espiritual. Deus não é judeu, nem cristão, nem muçulmano; Deus não é teísta, nem liberal, nem conservador, nem fundamentalista; Deus não é tradicional, nem pós-modernista. Deus sequer é. Talvez a melhor maneira que posso pensar agora para falar sobre o Divino seja: Deus [ ] Real. Os colchetes substituem a incompletude do verbo ser. O nome “Deus” simplesmente representa aquela Realidade que está além de minha compreensão. O próprio nome “Deus” se tornou problemático, já que é incompleto e questionável. Por isso, prefiro utilizar “Realidade” – já reconhecendo sua limitação, enquanto substantivo.

Não. Não posso acreditar em Deus. Não posso encarcerar o Divino a minhas concepções teológicas. Só posso confiar e ser leal. Acreditar, ou mesmo crer, é algo que está além de minha capacidade intelectual humana. Confiar me basta.

+Gibson

2 comentários:

  1. Desabafo.
    Cada vez que visito o seu blog, passo horas e dias refletindo sobre toda essa sua interessante experiência, no mínimo provocativa, instigadora, no que diz respeito a Deus, ou ao Divino,como sempre coloca.Como gostaria de ter essa tranquilidade ao afirmar que Deus é maior , é mais , é indefinível.Mas durante décadas estive aprisionada à ideia do Deus que sente, ver, pune,ignora corrige, protege, ama... Simplesmente sinto medo de nao crer nesse Deus.Sim, ao menor sinal de perigo, todo o pensamento sofisticado, as ideias rebuscadas, os textos estudados vão pro espaço, e lá vou eu em busca do Deus que pode me livrar do mal. É frustrante e angustiante. Mas é a minha realidade.Todavia, devo parabenizá-lo,pelo blog, pela riqueza dos textos, pela pesquisa.Tem sido fundamental na minha busca pessoal por DEUS.

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  2. Cara Sarah,

    Não há nada de errado em crer nesse Deus; quero dizer: em entender Deus como uma pessoa que está lá para protegê-la, amá-la, e, quem sabe, até puní-la. Talvez só tenha que encontrar uma forma de manter essa compreensão sem que ela a faça sentir frustrada; ou seja, talvez você tenha que tentar pensar em Deus mais como um "Paizinho" (Abba) do que como um "Rei" - exatamente como a tradição diz que Jesus fez. Minhas orações e pensamentos estarão com você.

    Grande abraço!

    +Gibson

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