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quarta-feira, 30 de julho de 2014

Sobre o Unitarismo, parte 3


Caro Edgar,

Recebi sua mensagem esta manhã, e aqui tento responder, mais uma vez, aos seus questionamentos – sem esquecer que ainda tenho outras questões que não foram respondidas por falta de tempo.

Se pareço repetitivo, em alguns de meus comentários, é pelo simples fato de minhas respostas serem públicas e por, supostamente, muitos de meus leitores não estarem tão familiarizados assim com a história ou o pensamento teológico unitarista.

Já expliquei, neste blog, a razão pela qual respondo a questões teológicas de forma pública, mas vale repetir aqui. Como todos os questionamentos que frequentemente recebo dos visitantes deste blog se relacionam, majoritariamente, ao que leram aqui, então creio ser razoável supor que outras pessoas poderiam ter questionamentos semelhantes. Ademais, uma comunicação pública ajuda a evitar o alastramento de compreensões errôneas sobre algo que tenha escrito e publicado aqui: alguém poderá sempre se referir ao que escrevi publicamente, e eu não poderei dizer que não escrevi aquilo!

Você me compreende equivocadamente se pensa que tenho uma “antipatia pelo unitário-universalismo”. Não tenho uma “antipatia” pela tradição do Universalismo Unitarista (é assim que traduzo a expressão “Unitarian Universalism”) -, em termos de origens históricas, sou parte dessa tradição. Tenho críticas à maneira como a mesma é compreendida pelos, chamemos, “recém-conversos” à tradição e à maneira como uma tradição de fé se tornou apenas uma ideologia sociopolítica. Minha crítica é de natureza teológica e, especificamente, eclesiológica. No que concerne à fé e à teologia, vejo um grande problema quando se desconstrói demais, e não se constrói nada relevante e duradouro no lugar; quando se faz questão de abrir mão duma identidade própria para fazer com que os “novos” se sintam bem-vindos em nossa própria casa. Novamente, para que você compreenda isso, tem de se dedicar a compreender a história de nossas tradições de fé – assim compreenderia a natureza de minha crítica e de muitos outros.

O termo “Universalismo Unitarista” (ou “unitário-universalismo”, como queira), hoje, se refere a uma tradição desassociada de suas raízes cristãs. O termo Unitarismo, por outro lado, continua a ser – para nós cristãos unitaristas liberais – uma afirmação de nossa lealdade à tradição cristã liberal da qual nossa tradição emergiu. Isso não significa, entretanto, ser adepto de posições teontológicas (sobre Deus) ou cristológicas (sobre Cristo) específicas. O que significa, para mim, é que Universalismo Unitarista é diferente de Unitarismo, e diferente de Universalismo; o fato de haver emergido duma mescla das tradições unitarista e universalista não tornam a tradição “unitário-universalista” sinônimo daquelas duas, que são tradições cristãs. Isso é o que alguns chamariam de “fato” histórico!

Quanto a mim, como já discuti algumas vezes aqui, faço muita pouca questão de me identificar estritamente como membro desta ou daquela tradição cristã – isso em consequência de minhas múltiplas heranças cristãs. Se o faço aqui é para afirmar minha herança teológica. Prefiro reconhecer minha dívida para com todas essas tradições cristãs que moldaram minha fé pessoal (a anglicana, a unitarista, a universalista, a luterana); e, por isso mesmo, me identificar como um cristão livre. E mesmo essa atitude, que marca minha compreensão do Cristianismo, advém da própria tradição unitarista. James Martineau, por exemplo, um teólogo e ministro unitarista inglês do século XIX, usava o termo “cristão livre” com o sentido de ser livre duma imposição de ortodoxia religiosa – ele sugeria que os unitaristas deixassem de usar o adjetivo “unitarista” (que, lembre-se, fora imposto por outros que, equivocadamente, imaginavam que todos os unitaristas fossem adeptos duma compreensão teontológica e cristológica específica) como identificador, em favor da expressão “cristão livre”, que ele acreditava ser mais inclusiva. Assim, as igrejas “unitaristas” poderiam se tornar o lar de cristãos das mais diversas teologias, onde todos seriam bem-vindos. Resta dizer que isso, até certo ponto, realmente aconteceu, mas trouxe consigo um efeito indesejado para os cristãos unitaristas no mundo anglófono: a “descristianização” de nossa tradição. Nos Estados Unidos, especificamente, emergiriam outros movimentos nos meios unitaristas: O Movimento da Religião Livre, e o Movimento Humanista, que influenciariam a união entre as igrejas universalistas e unitaristas, e a formação daquilo que hoje é chamado de Universalismo Unitarista (que não deve ser confundido, em absoluto, com os tradicionais Unitarismo e Universalismo, enquanto tradições cristãs).

Logo, se você perceber, há paralelos entre o que ocorreu com o Movimento do Universalismo Unitarista ("UUismo") e o Unitarismo, um de seus berços. O Unitarismo se esforçou para demolir os edifícios que o separava de outras formas de Cristianismo liberal – assim, podemos ler, por exemplo, um batista como Harry Emerson Fosdick defender, no início do século XX, uma teologia liberal defendida pelos unitaristas há mais de um século, sem, no entanto, se identificar como unitarista; assim, me atrevo a dizer que unitaristas, universalistas, anglicanos, batistas, presbiterianos, e metodistas, por exemplo, ensinavam, na prática, a mesma coisa até meados do século XX (durante o auge da teologia liberal no meio protestante nos Estados Unidos). O “Uuismo”, posteriormente, foi além e derrubou o edifício teológico cristão para tornar-se uma tradição multirreligiosa, na qual, paradoxalmente, a própria identidade religiosa se tornaria sinônimo de quase nada – ou seja, na prática, a tradição do Universalismo Unitarista se fundamenta em negações a, e não em afirmações de. Algo semelhante ao universalismo multirreligioso do (polêmico) Rev. Kirby J. Hensley, fundador da “Igreja da Vida Universal”, cujo dogma era “fazer apenas aquilo que é certo”.

Por isso, faço questão de enfatizar que Universalismo Unitarista e Unitarismo (e Universalismo) não são idênticos. O Cristianismo é a raiz da qual emergiu a tradição unitarista – e também a universalista. Foi daí que emergiu nossa compreensão de Deus, de Jesus, das Escrituras, da dignidade humana, da liberdade espiritual e de consciência, etc. Nossa histórica compreensão de Deus se baseia nos ensinamentos das Escrituras judaico-cristãs sobre a unicidade de Deus. Nosso compromisso com a liberdade espiritual vem da noção de que “onde se encontra o Espírito do Senhor, aí está a liberdade” (2 Coríntios 3:17). Nossa crença na dignidade humana e, consequentemente, nossa história de inclusão radical se assenta sobre o espírito das Escrituras que dizem que “não há mais diferença entre judeu e grego, entre escravo e homem livre, entre homem e mulher, pois todos vocês são um só em Jesus Cristo” (Gálatas 3:28).

Ou seja, as afirmações unitaristas são afirmações cristãs. Nossas compreensões teológicas específicas podem não ser partilhadas por todos os cristãos, mas elas emergem das raízes cristãs. Sua linguagem é cristã, sua narrativa é cristã, sua identidade é cristã. E essa identidade é maior que nossas filiações eclesiásticas particulares – assim, os unitaristas que são membros de igrejas cristãs não-unitaristas não veem isso como um desafio a suas convicções (ao menos no mundo anglófono, já que no Brasil as filiações eclesiásticas tendem a estar atreladas à aceitação de afirmações teológicas específicas, e tendem a não permitir a duplicidade de membresia eclesiástica). Eu, como a maioria dos outros cristãos unitaristas que conheço – sejam eles, nos Estados Unidos, membros de congregações da UUA ou de outras igrejas unitaristas, ou da Igreja Episcopal, da Igreja Unida de Cristo; ou, no Brasil, membros de congregações especificamente unitaristas –, identifico um unitarista como um cristão liberal e livre, mas, mesmo assim, fiel à sua tradição de quase cinco séculos. Não preciso negar essa tradição para ser receptivo a outras pessoas. Prefiro estar aberto e receptivo a todos, ao mesmo tempo em que me mantenho fiel à minha identidade religiosa.

Estero ter conseguido responder à sua mensagem de hoje. Grande abraço!

+Gibson

sexta-feira, 25 de julho de 2014

Sobre o Unitarismo, parte 2


Caro Edgar,

Continuo aqui, depois de mais de um mês, minha tentativa de responder algumas daquelas várias questões levantadas por você. Em minha mensagem anterior, havia tratado sobre algumas informações históricas que julgo importantes para sua compreensão do Unitarismo, enquanto tradição cristã. Aqui, continuarei a tratar algumas das questões subsequentemente levantadas por você.

A maneira mais fácil de descrever nossa tradição é, simples e imperfeitamente, afirmar que há uma grande diversidade entre nós. Isso, basicamente, significa que os unitaristas, individualmente, abraçam uma ampla gama de perspectivas teológicas e estão ligados a diferentes tipos de igrejas.

Eclesiasticamente, também somos muito diversos. Há igrejas unitaristas de governo episcopal, isto é, igrejas com bispos (como nas igrejas unitaristas da Transilvânia e Hungria); há igrejas unitaristas congregacionais (como a maioria das igrejas unitaristas do mundo anglófono, e no Brasil); e há igrejas unitaristas presbiterianas (como algumas nas Ilhas Britânicas). Contudo, é sempre bom lembrar-se que nem todos os unitaristas são membros duma igreja especificamente unitarista. E há muitos auto-declarados unitaristas, especificamente no mundo anglófono (especialmente nos Estados Unidos), que são membros de outras igrejas cristãs – especialmente a Igreja Unida de Cristo, a Igreja Cristã (Discípulos de Cristo), outras igrejas congregacionais ou a Igreja Episcopal – ou, simultaneamente, membros duma igreja unitarista e de alguma outra igreja cristã (essa é minha experiência pessoal, à propósito), por razões muito específicas à realidade local.

Apesar de nossa diversidade, entretanto, acredito poder apontar convicções que são comuns à maioria dos unitaristas, ao menos da tradição anglófona – o que é o meu caso. Lembre-se, contudo, que entre nós não há a obrigação de se aderir a definições teológicas pormenorizadas, então, os indivíduos são sempre livres para compreenderem a fé de sua maneira. Assim, tradicionalmente, vemos nossa união como sendo mantida por um espírito de simpatia e cooperação, e não pela imposição de fórmulas, de declarações de fé, de credos – nós, entretanto, não rejeitamos essas declarações ou credos necessariamente, rejeitamos apenas sua imposição aos indivíduos como requisito para que sejam parte da mesma comunidade de fé. Essa é a tradição de liberdade de consciência, tão apreciada em nossa tradição.

A tradição unitarista, tradicionalmente, identifica como cristão toda pessoa que se [auto]identifique como um seguidor de Jesus Cristo. Assim, não acreditamos ou ensinamos que alguém tenha de ser um unitarista para ser um cristão “verdadeiro”. Assim como não excluímos ou julgamos pessoas de outras tradições religiosas não cristãs por não serem cristãs ou não serem unitaristas. Não equacionamos o Divino com uma compreensão particular de Deus. Foi dessa compreensão, compartilhada por cristãos unitaristas e universalistas – a seu próprio modo –, aliás, que adveio o espírito de respeito ou “abertura” para com outras tradições de fé que marca a tradição “unitário-universalista” (descendente duma mescla daquelas duas, especialmente do movimento da “Religião Livre” e, posteriormente, do movimento humanista dos unitaristas). Logo, você se equivoca quando afirma que essa atitude seja uma característica originalmente “unitário-universalista” enquanto movimento não cristão, como se diferentes tradições cristãs devessem corresponder a um estereótipo de “fanatismo” ou “fundamentalismo” nascidos de sua própria experiência com o(s) Cristianismo(s) brasileiro(s).

Como cristãos, damos grande ênfase à Bíblia em nossa tradição, mas a maneira como a compreendemos pode soar muito diferente da forma como outras tradições cristãs brasileiras a veem. Nós unitaristas não acreditamos na infalibilidade da Bíblia. Entendemos a Bíblia como um testemunho da relação de certos grupos humanos (a antiga Israel e a “Igreja primitiva”) com Deus; ou seja, a Bíblia é um conjunto de escritos humanos que passou por um processo de canonização até tornar-se Escritura Sagrada. Ou seja, os escritos do apóstolo Paulo, por exemplo, não eram Escritura, não eram textos canônicos, quando ele os escreveu; essa canonização, transformação do texto em Escritura, ocorreu ao longo do tempo e depois de debates e disputas teológicas na Igreja cristã. Nós unitaristas, tradicionalmente, abraçamos essa compreensão histórica em nossa apreciação da Bíblia, que, entretanto, não deixa de ser Escritura sagrada, apesar de sua humanidade!

Para compreender nossa relação de dependência teológica para com a Bíblia, você precisa compreender que, como escrevi na primeira parte desta resposta, as tradições cristãs unitarista e universalista emergiram atreladas ao princípio de “sola scriptura”; ou seja, as compreensões teológicas cristãs, na visão de nossos fundadores, deveriam encontrar sua raison d'être nas Escrituras (Bíblia). O que diferenciava especialmente os primeiros unitaristas de outros protestantes era sua valorização do conhecimento humano e da consciência individual para a leitura das Escrituras – o que, necessariamente, implicaria uma maior diversidade de perspectivas teológicas. Mas o que importa, aqui, é saber que todos os argumentos levantados para as perspectivas teológicas defendidas por unitaristas, e universalistas, advinham de sua leitura professa das Escrituras – obviamente, imersa em certas compreensões filosóficas que marcaram seu próprio tempo, desde o século XVI até hoje.

Logo, apesar de haver princípios comuns aos autores unitaristas ao longo desses séculos, seus argumentos e compreensões mudavam/mudam a depender dos contextos culturais nos quais viviam/vivem. Fausto Sozzini, Joseph Priestley, Thomas Belsham, William Ellery Channing, James Freeman Clarke, Charles Gordon Ames, James Luther Adams, e tantos outros autores de nossa tradição, defendiam visões não plenamente idênticas, mas entrelaçadas na fé cristã que partilhavam. Assim, por exemplo, um cristão liberal unitarista como eu pode não se sentir plenamente confortável com as compreensões esposadas no Catecismo Racoviano (tão influenciado pelas ideias teológicas de Sozzini), ou mesmo abraçar as cristologias de Priestley, Channing ou Clarke, mas reconhecerá que essa diversidade é uma parte essencial de nossa tradição. Apesar da partilha de muitas ideias, os unitaristas poloneses e transilvanos, por exemplo, diferiam em muito de seus correligionários ingleses, que poderiam ser vistos como mais “liberais”. E os unitaristas ingleses, por sua vez, diferiam dos unitaristas americanos em termos teológicos. E, nos Estados Unidos, os unitaristas da Nova Inglaterra diferiam dos unitaristas do Oeste. Todos, entretanto, se viam como coparticipantes da mesma tradição!

À propósito, a diversidade é uma marca necessária das tradições cristãs liberais, sejam elas a unitarista, a universalista, a quaker, a batista geral, a presbiteriana não-subscrevente ou a remonstrante, por exemplo. Como encontrar concordância plena em termos de teologia dogmática é complicado em nosso meio, posso apontar alguns pontos comuns entre nós – e entre nós e outros cristãos (como aqueles grupos citados acima):

1) Para nossas tradições, a união comunitária na Igreja não exige a uniformidade de crenças. Há uma grande valorização do indivíduo, mas o indivíduo transcende seu isolamento por meio do mover do Espírito Santo na comunidade. As posições minoritárias na igreja, em nossas tradições, devem ser protegidas em nome dessa ação do Espírito Santo (que, obviamente, compreendemos de maneiras bem diversas em nossas diferentes tradições). A manutenção da liberdade de consciência individual – talvez a principal bandeira de nossas tradições – era e é vista como uma aliança entre a igreja e Deus, e entre os membros da igreja. Dessa ideia duma aliança particular entre os membros duma igreja, e entre esses e Deus, e o alto grau de autonomia local que dela deriva, vem a essência do que é chamado de “congregacionalismo” – o tipo de eclesiologia mais comum entre nós.

É bom esclarecer, ademais, que a própria democracia política moderna emergiu dessas ideias congregacionalistas, e outras semelhantes. O teólogo unitarista James Luther Adams, por exemplo, chamava esse princípio de “coarquia”, que ele contrapunha à “hierarquia”. Os defensores da autonomia da igreja local consideravam que sua visão de “igreja livre” deveria tornar-se um modelo para um estado democrático. Seus conceitos políticos derivavam, por analogia, de seus conceitos eclesiásticos. O que constituíra, originalmente, elementos duma “eclesiologia” (isto é, duma doutrina sobre a natureza e organização da igreja), era usado agora como ingredientes duma teoria política: o consentimento dos governados, a exigência do sufrágio universal, um executivo sujeito à lei, o princípio da oposição leal. O conceito básico de sociedade democrática, assim, descende do conceito de “igreja livre” defendida pelos nossos ancestrais unitaristas, e de outras tradições cristãs liberais.

2) Uma crença na e afirmação da dignidade humana, e uma confiança na capacidade humana. Isso como uma resposta às noções de natureza humana depravada ou caída características de certos grupos protestantes. Na verdade, essa pode ser apontada como a principal diferença entre os unitaristas e outros cristãos. Apesar de outros cristãos (incluindo os universalistas) terem sempre enfatizado nossas noções mais antigas sobre Deus ou Cristo como sendo nosso principal distintivo, nós unitaristas costumamos apontar nossa visão do ser humano. O Unitarismo rejeita a doutrina do pecado original – e isso, obviamente, tem um enorme impacto sobre como nossa tradição compreende o ser humano. O que isso significa hoje, para nós, é que vemos o ser humano como capaz de fazer tanto o bem quanto o mal, e daí a importância que damos à educação, tanto em nosso meio quanto na sociedade como um todo.

3) Uma valorização e paixão pela racionalidade. A história de nossa tradição é marcada pelo esforço contrário ao tradicionalismo rígido e arbitrário, e contra aquilo que nossos antepassados chamavam de “obscurantismo”. Um encorajamento, apropriação e ênfase de valores da cultura letrada e da ciência, como formas de compreender nossa fé e enriquecê-la em nossas vidas sociais. Assim, a leitura das Escrituras na tradição unitarista foi moldada por essa herança de diálogo entre a fé e a “alta cultura” produzida pelos meios intelectuais, especialmente nos países de língua inglesa.

Esses são apenas alguns dos princípios unitaristas, compartilhados com outros grupos cristãos liberais, que eu poderia apontar. Ainda devo-lhe uma resposta sobre alguns conceitos sobre Deus e Cristo. Mas essa fica para uma próxima mensagem.

Grande abraço e bençãos!

+Gibson

terça-feira, 15 de julho de 2014

Uma fé cristã não exclusivista: uma resposta a Mauro


Caro Mauro,


Agradeço por seus comentários, apesar de nossas diferenças de opinião. Deixe-me responder a algumas de suas provocações da forma “direta e crua”, como me pediu.


Partilho de seu respeito pela Bíblia. Como em seu caso, enxergo a Bíblia como Escritura Sagrada – na verdade, na maioria das vezes, é exatamente assim que me refiro à Bíblia, como “Escrituras” (como pode ver em vários de meus textos aqui) –, como textos canônicos para minha fé.


Diferentemente de você, contudo, não entendo as Escrituras como textos divinos em sua origem. A Bíblia, em minha visão, é um produto humano que emergiu da tentativa de antigas comunidades darem uma resposta à sua experiência com Deus. Ela, a Bíblia, possui um status e desempenha uma função sagrada em minha vida de fé, mas isso não quer dizer que a interprete literalmente, ou que por causa duma interpretação específica dela feche minha mente para outras coisas que sei sobre o Universo do qual sou parte.


Infelizmente, para você, dizer isso é sinônimo de “negar a fé”. Você, aparentemente, só não conseguiu conciliar essa afirmação com o que tinha dito no início de sua mensagem. Pois se não sou um “cristão verdadeiro”, então você não pode, coerentemente, me acusar de estar negando a fé, já que minha fé não seria a mesma da sua, de qualquer forma. Consegue ver a incoerência de sua afirmação?


Não me preocupo muito em discutir teologia dogmática stricto sensu. Isso não quer dizer que não me importe com isso em minha reflexão teológica, já que tudo se relaciona a ela em teologia. Só evito tratar muito disso aqui.


Sua acusação de que eu seja um “acadêmico” tentando desacreditar o Cristianismo é absurda, com todo respeito – ao menos, no sentido em que usou o termo “acadêmico”. Em primeiro lugar, não sou um acadêmico, sou um Ministro religioso; e mesmo meu ensino de Teologia se dá num seminário teológico, num ambiente não-laico. Em segundo lugar, se não percebeu, este espaço tem uma “missão” claramente religiosa, e não “acadêmica” – é só ler a descrição do mesmo.


Minha compreensão do Cristianismo é não exclusivista. O Cristianismo é minha fé, é minha jornada rumo a um encontro com o Divino e com a humanidade. Dizer isso, entretanto, é diferente de dizer que o Cristianismo seja o único caminho válido rumo a esse encontro com o Divino e com a humanidade. Deus, se o compreendesse em termos antropomórficos – o que não é o caso -, não é cristão. Jesus não era cristão. Os primeiros seguidores de Jesus não eram “cristãos”. A maior parte da humanidade não é, nem foi, cristã. Da forma como compreendo Deus, até mesmo o ateísmo pode ser um caminho para um encontro com a Divindade. Então, obviamente, não compartilho de sua visão exclusivista e excludente da fé cristã. O Cristianismo, para mim, é uma jornada de compaixão, de encontro com o Divino e com a humanidade. Nossas concepções particulares de “Deus” ou da “fé” não podem ser mais importantes que aquele “encontro” prometido pela tradição cristã. É esse “encontro” que chamo de “compaixão”.


E, para finalizar da forma mais “direta e crua” possível, devo enfatizar que as pessoas para quem mantenho estas páginas, ou seja, os destinatários deste blog, são pessoas que estão dispostas a questionar, a pensar; são pessoas que estão em busca de algo diferente do que encontram em outros lugares. Ninguém é obrigado a ler o que publico aqui. Se você se indigna tanto com o que escrevo, pode sempre visitar outros sites que exibam um pensamento mais de acordo com suas perspectivas. Seus recorrentes comentários, utilizando uma linguagem tão violenta e grosseira, tão pouco compassiva, não servem como um bom testemunho de sua suposta fé. Espero que possa refletir um pouco sobre isso.


Grande abraço, e bençãos!


+Gibson