Gibson
da Costa
Considerando
a aparente “controvérsia” causada por minha
última postagem neste blog – na percepção de alguns que
me escreveram e-mails nos três últimos dias, isto é –, e
considerando que não tenho tempo de responder individualmente a
todos eles, permitam-me fazer alguns comentários.
Não
vejo muito necessidade para explicar minhas posições no que tange à
relação entre “religião” e “política”. Essas já estão
por demais explícitas em tudo o que tenho escrito aqui nos últimos
anos, em tudo o que tenho ensinado no seminário, em tudo o que tenho
publicado, e em todos as minhas prédicas. Sou um “cristão
liberal” ocidental (sim, também há um sentido político muito
específico nessa expressão). Afirmar isso já deveria ser
suficiente para explicitar o que penso acerca da relação entre
“Igreja” e “Estado”, seja quanto ao Cristianismo, seja no que
tange a quaisquer outras tradições.
Não
importa o que penso acerca daquilo que chamei de “Direito
Islâmico”, a “shari'a”. Minha opinião sobre se as diferentes
interpretações islâmicas são boas ou não, aceitáveis ou não,
justas ou não é irrelevante para o que escrevi. Minha intenção
ali era outra: intencionava apenas responder a algumas coisas que
havia lido e ouvido antes – coisas que julgo, vindas de quem
vieram, intelectualmente desonestas (tendo sido dito/escrito por quem
foi).
Posso
discordar de determinadas ideias, mas isso não pode fazer com que
feche os olhos à injustiça de acusações falsas. Discordar de
alguém ou de algo não faz com que eu automaticamente me torne
inimigo daquele/daquilo, e vice-versa. Alguém não se torna meu
inimigo simplesmente por não crer/praticar no/o mesmo que eu. E
mesmo que fosse meu inimigo, isso não tornaria justo que eu
aceitasse que acusações falsas fossem feitas ao seu respeito.
A
comparação acima pode parecer exagerada, mas, em minha percepção
de alguns dos comentários que me enviaram, parece que alguns pensam
que estou defendendo “o inimigo”!… Minha pergunta a esses
leitores é: por que o Islã ou os muçulmanos seriam meus
inimigos? Como já escrevi inúmeras vezes, convivi e convivo com
muitos muçulmanos. Conviver com pessoas diferentes de você pode
fazer com que se aprenda muito sobre os limites dessas diferenças!…
E isso, a propósito, vale quanto a todos os aspectos da vida social,
e não só religião.
Em
nenhum ponto do que publiquei aqui justifiquei a imposição duma lei
religiosa àqueles que não a desejassem. Muito pelo contrário.
Expliquei que havia uma diversidade de interpretações do Direito
Islâmico, e o fiz justamente para me opor à visão dum Islã
uniforme – que é defendido tanto por islamitas fanáticos quanto
pela retórica dos meios de comunicação “ocidentais”.
A
propósito, há uma enorme diferença conceitual entre ser
“muçulmano” e ser “islamita” (ou “islamista”).
O termo “muçulmano” refere-se a um adepto do Islã. O termo
“islamita” (ou “islamista”), por sua vez, refere-se a um
adepto duma ideologia política, que politiza a religião muçulmana
– aquilo que, em minha vida acadêmica, chamo de Islã Político.
Essa ideologia, per se, é uma construção recente. Se quiser saber
um pouco mais, pode ler algo que já escrevi a respeito AQUI.
Quanto à acusação de que eu seja um “ignorante manipulado pela esquerda”, feita por uma leitora, cometerei a indelicadeza de responder de forma arrogante: [Na verdade, não entendo por que usaria o adjetivo “esquerda” aqui!] Quantas vezes você já leu o Corão em língua árabe? Quantos livros teológicos islâmicos você já leu? Quantos amigos muçulmanos você tem? Em quantos países com maioria muçulmana você já morou ou já esteve?… Talvez eu não seja tão “ignorante” e “manipulado” quanto você pensa!!… Geralmente, prefiro não escrever acerca de temas sobre os quais não tenha um mínimo de informação!
Há
algum tempo, tenho me preocupado com a forma como meus irmãos e
irmãs muçulmanos têm sido retratados pelos meios de comunicação,
pelos pronunciamentos de personagens do mundo político e,
principalmente, pelo discurso religioso de outros grupos –
especialmente cristãos. Como um humano e um cristão, me calar
enquanto essas irmãs e esses irmãos têm sua fé injustamente
retratada como sinônimo de violência e terror é trair à minha
própria fé. Continuarei a criticar o que deve ser criticado, mas
não participarei do festival de inverdades e discriminação.
Como
um cristão, renuncio à islamofobia, doe a quem doer!
+Gibson