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sábado, 21 de novembro de 2015

Sobre “uma brevíssima explicação acerca da shari'a”



Gibson da Costa

Considerando a aparente “controvérsia” causada por minha última postagem neste blog – na percepção de alguns que me escreveram e-mails nos três últimos dias, isto é –, e considerando que não tenho tempo de responder individualmente a todos eles, permitam-me fazer alguns comentários.

Não vejo muito necessidade para explicar minhas posições no que tange à relação entre “religião” e “política”. Essas já estão por demais explícitas em tudo o que tenho escrito aqui nos últimos anos, em tudo o que tenho ensinado no seminário, em tudo o que tenho publicado, e em todos as minhas prédicas. Sou um “cristão liberal” ocidental (sim, também há um sentido político muito específico nessa expressão). Afirmar isso já deveria ser suficiente para explicitar o que penso acerca da relação entre “Igreja” e “Estado”, seja quanto ao Cristianismo, seja no que tange a quaisquer outras tradições.

Não importa o que penso acerca daquilo que chamei de “Direito Islâmico”, a “shari'a”. Minha opinião sobre se as diferentes interpretações islâmicas são boas ou não, aceitáveis ou não, justas ou não é irrelevante para o que escrevi. Minha intenção ali era outra: intencionava apenas responder a algumas coisas que havia lido e ouvido antes – coisas que julgo, vindas de quem vieram, intelectualmente desonestas (tendo sido dito/escrito por quem foi).

Posso discordar de determinadas ideias, mas isso não pode fazer com que feche os olhos à injustiça de acusações falsas. Discordar de alguém ou de algo não faz com que eu automaticamente me torne inimigo daquele/daquilo, e vice-versa. Alguém não se torna meu inimigo simplesmente por não crer/praticar no/o mesmo que eu. E mesmo que fosse meu inimigo, isso não tornaria justo que eu aceitasse que acusações falsas fossem feitas ao seu respeito.

A comparação acima pode parecer exagerada, mas, em minha percepção de alguns dos comentários que me enviaram, parece que alguns pensam que estou defendendo “o inimigo”!… Minha pergunta a esses leitores é: por que o Islã ou os muçulmanos seriam meus inimigos? Como já escrevi inúmeras vezes, convivi e convivo com muitos muçulmanos. Conviver com pessoas diferentes de você pode fazer com que se aprenda muito sobre os limites dessas diferenças!… E isso, a propósito, vale quanto a todos os aspectos da vida social, e não só religião.

Em nenhum ponto do que publiquei aqui justifiquei a imposição duma lei religiosa àqueles que não a desejassem. Muito pelo contrário. Expliquei que havia uma diversidade de interpretações do Direito Islâmico, e o fiz justamente para me opor à visão dum Islã uniforme – que é defendido tanto por islamitas fanáticos quanto pela retórica dos meios de comunicação “ocidentais”.

A propósito, há uma enorme diferença conceitual entre ser “muçulmano” e ser “islamita” (ou “islamista”). O termo “muçulmano” refere-se a um adepto do Islã. O termo “islamita” (ou “islamista”), por sua vez, refere-se a um adepto duma ideologia política, que politiza a religião muçulmana – aquilo que, em minha vida acadêmica, chamo de Islã Político. Essa ideologia, per se, é uma construção recente. Se quiser saber um pouco mais, pode ler algo que já escrevi a respeito AQUI.

Quanto à acusação de que eu seja um “ignorante manipulado pela esquerda”, feita por uma leitora, cometerei a indelicadeza de responder de forma arrogante: [Na verdade, não entendo por que usaria o adjetivo “esquerda” aqui!] Quantas vezes você já leu o Corão em língua árabe? Quantos livros teológicos islâmicos você já leu? Quantos amigos muçulmanos você tem? Em quantos países com maioria muçulmana você já morou ou já esteve?… Talvez eu não seja tão “ignorante” e “manipulado” quanto você pensa!!… Geralmente, prefiro não escrever acerca de temas sobre os quais não tenha um mínimo de informação!

Há algum tempo, tenho me preocupado com a forma como meus irmãos e irmãs muçulmanos têm sido retratados pelos meios de comunicação, pelos pronunciamentos de personagens do mundo político e, principalmente, pelo discurso religioso de outros grupos – especialmente cristãos. Como um humano e um cristão, me calar enquanto essas irmãs e esses irmãos têm sua fé injustamente retratada como sinônimo de violência e terror é trair à minha própria fé. Continuarei a criticar o que deve ser criticado, mas não participarei do festival de inverdades e discriminação.

Como um cristão, renuncio à islamofobia, doe a quem doer!

+Gibson

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