Caro
“Unitarista Mineiro”,
Li o
que você escreveu e confesso que não sabia exatamente por onde
começar. Decidi, então, iniciar minhas observações por definições
simples – como se deveria fazer em qualquer debate de ideias.
É
importantíssimo deixar claro que a razão para a sua suposta
“confusão”, em minha opinião, é possuirmos um background
religioso/intelectual/sociocultural bem diferente – o que faz com
que mesmo que utilizemos os mesmos termos, atribuamo-lhes sentidos
muito distintos.
Você
me acusa, por exemplo, de rejeitar “a verdade” sobre Deus,
citando alguns textos publicados aqui e em um de meus livros. Mas o
que lhe pergunto é: você realmente leu minhas perspectivas sobre
“verdade” e sobre “Deus”? Os argumentos que você utiliza
como apoio às suas observações sugerem que você não tenha lido
atentamente aqueles textos – parece, na verdade, ter apenas lido
alguns comentários feitos por outros acerca do que eu supostamente
penso (comentários esses que se tornaram comuns em alguns meios
ditos “evangélicos”). Para mim, seria muito mais interessante
dialogar sobre o que escrevi com alguém que tenha, de fato, lido
o que escrevi.
Muitas
vezes não escrevo de forma tão direta ou objetiva quanto alguns
querem pelo simples fato de Deus e fé, por exemplo, não serem temas
objetivos, quantificáveis, metrificáveis. Não acredito num Deus
que possa ser pesado, metrificado, analisado sob as lentes dum
microscópio, já que Deus não é – em minha experiência e
compreensão – um objeto! Se uso uma linguagem provocadora é
porque, no meu meio religioso e sociocultural, essa é mais
compreensível – além de a mesma ser uma marca de minha
personalidade. Por isso posso dizer que “não
posso acreditar em Deus” – porque a maioria de meus leitores,
provavelmente, compreendem minha escolha da metáfora como
instrumento para falar sobre certos conceitos teológicos. Quando
digo isso, eles entendem que estou fazendo uma crítica ao uso de
certos conceitos acerca de Deus com os quais não concordo
plenamente.
Sua
tática de atacar minha vida pessoal é a menos merecedora de
comentários, mas a comentarei assim mesmo. Não o conheço
pessoalmente, o que implica que você também não me conhece
pessoalmente – se alguma vez, mesmo que improvavelmente, tenhamos
estado fisicamente no mesmo local, isso não significaria que você
me conheça. Posso citar exatamente as fontes de seus comentários,
onde estão e quem os fez originalmente (pessoas, a propósito, que
também não me conhecem e que encontraram em teorias da conspiração
uma forma infeliz de lidar com a pluralidade religiosa no mundo!).
O
joguete de deslegitimar a opinião dum “oponente” com base em
acusações contra sua vida pessoal – em meu caso explícito, com
base em minha vida eclesiástica – é tão antigo quanto imoral.
Foi usado no meio político romano; foi usado nos primórdios da
Igreja cristã; foi usado ao longo das eras; e é, infelizmente,
ainda usado em nossas sociedades ditas pós-modernas. Meu apelo é à
civilidade: se você discorda de minhas ideias ou das ideias
teológicas que defendo, ataque-as e não a mim – é isso que faço
e que continuarei a fazer, se discordo de algo ou de alguém (deixo
os ataques pessoais para as crianças que ainda estão aprendendo a
viver em sociedade, e para aqueles que não se esforçam em percorrer
a trilha da compaixão).
Sua
mensagem é tão incoerente em termos conceituais que não consegui
entender se você tenta se identificar como um “unitarista bíblico”
ou como um “unitário-universalista”. Esses dois conceitos são
contraditórios, mas você defende a ambos simultaneamente! Eu,
pessoalmente, não me identifico como nenhum dos dois! Sou,
eclesiasticamente, um unitarista – o que identifico, em
minha experiência de fé e prática, como um “cristão liberal”
herdeiro da tradição unitarista anglófona. Não tenho o mínimo
interesse em definir o que isso seja para qualquer outra pessoa –
seja membro de minha própria comunidade de fé, seja para alguém de
fora. Assim, se você se diz um “unitarista”, mesmo que seu
discurso esteja muito alheio à minha tradição e mesmo que você se
mostre desinformado quanto à mesma, esse é seu direito – o que eu
teria a ver com isso?… Mas, se você escreve para um Ministro de
uma igreja unitarista, tentando ensinar-lhe sobre a tradição que
você aparentemente desconhece, então você tem de estar preparado
para uma resposta que talvez não lhe agrade muito!
Nunca
menti sobre [ou omiti] minha história eclesiástica aos meus
leitores (nem, muito menos, aos meus paroquianos!). Sempre deixei
claro que tenho uma múltipla herança religiosa, já que venho de
família multirreligiosa. Sou um unitarista-anglicano, com ligações também
às tradições luterana, congregacional, restauracionista e quaker. Além de herdeiro do Judaísmo
Reconstrucionista.
É
óbvio que alguém com minha experiência religiosa e minha formação
teológica não poderia pensar como você pensa acerca da Divindade.
Em nenhuma das tradições que me formaram como ser religioso há o
predomínio duma visão de Deus, da Bíblia, de Jesus como a que você
afirma ser “a verdadeira”. Logo, eu estou sendo “verdadeiro”
e “honesto” para com minha própria tradição de fé – que é,
em si mesma, polifônica.
Não
direi a você no que deve acreditar. Direi, sim, no que acredito eu.
Acredito e confio na Realidade de Deus. Sobre essa Realidade, é dito
nas Escrituras que é amor. Quando enfatizo essa definição de Deus,
alguns insistem que com isso queira dizer que não há “certo” ou
“errado”: estão errados – quando digo isso, apenas enfatizo
minha compreensão das Escrituras e tradições judaico-cristãs que
apontam Deus como cerne da compaixão capaz de nos tornar “humanos”,
como “elemento” indispensável na construção das relações
entre os seres humanos (os “filhos/as de Deus”). Meus leitores e
ouvintes, incluindo você, podem construir suas próprias
interpretações de minhas palavras para si, mas – com todo
respeito – não podem querer dizer a mim o que minhas palavras
devam significar!
Apesar
de nossas discordâncias, continuarei a mantê-lo em minhas orações
e, humildemente, peço o mesmo de você.
Respeitosamente,
Rev.
Gibson da Costa
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