Gibson
da Costa
A
vida etérea das “redes sociais” é a vida do marketing pessoal.
Estamos todos numa vitrine na qual nos vendemos por meio das
aparências. É a vida das edições de imagens, que impulsionam a
[auto]massagem do ego na disputa pelos “likes” da “Rede Social”
de todas as redes sociais. É a vida das imagens com citações
descontextualizadas e, muitas vezes, apócrifas. Agora, a disputa e o
conflito giram em torno de outra forma de poder: o poder da imagem
autoconstruída dum “eu-mercadoria”, projetado, desenhado,
manipulado, escrito pelo gosto e preferências alheias.
A
coisa triste dessa baratização da humanidade digitalizada é que
facilmente nos tornamos vítimas de falsos “filósofos”. E a
“Rede Social” está repleta desses. Eles oferecem uma autoajuda
barata que se vende como “filosófica”; uma autoajuda que oferece
a “cura” para o deficit de “leitura” de nossa cultura: criam
inimigos e heróis – os inimigos, claro, são todos aqueles de quem
discordam e que deles discordam; os heróis são eles próprios,
cercados por acólitos que repetem os refrões bélicos típicos de
fanáticos!
E eu
que sempre pensara que a criticidade fosse a base da filosofia! O
julgar pela aparência, em minha compreensão, se afasta muito de
qualquer noção filosófica de criticidade. Ou, como bem escreveu
Roger Scruton (autor com quem nem sempre concordo): “os seres
racionais não somente olham para as coisas, eles olham dentro das
coisas”. Assim, qualquer “filósofo” que se venda como fonte de
verdade única, enquanto condena todo e qualquer autor como se fosse
mentiroso e, por isso, inferior a si, pratica qualquer coisa, menos
filosofia!
A
filosofia é inseparável do pensamento crítico, e este – de
acordo com Hannah Arendt – faz com que tornemos “o outro”
presente por meio da imaginação. Essa criticidade (ou
“esclarecimento”) nos faria conhecer e considerar os pontos de
vista de outras pessoas. E, assim, poderíamos analisar um objeto por
todos os lados, a partir de diferentes perspectivas.
Proclamar
anátemas não é filosofar; é, antes, dogmatizar. E a dogmatização
é um instrumento utilíssimo para o marketing pessoal daqueles que
se vendem como “gurus” da “filosofia” das redes sociais. Como
o que proclamam é “a verdade”, e todos os outros são
mentirosos, seus discípulos os veem como “autoridade”
intelectual, moral, espiritual etc. Assim, uma nova geração de
fanáticos é criada. O questionamento e o filosofar são assaltados.
Defensores da violência, da tortura, do autoritarismo e da
hierarquia são exaltados como baluartes da “esperança” – uma
esperança vazia que já decepcionou inúmeros no passado e não
falhará em decepcionar os acólitos desses falsos “filósofos”
do presente.
Você
não tem de acreditar em nada do que escrevo. Não quero nem preciso
de seguidores. Apenas convido você, que lê essas palavras, a olhar
para “dentro das coisas”, a analisar qualquer coisa a partir de
diferentes perspectivas. Em outras palavras, convido você a
filosofar!
Referências
ARENDT,
Hannah. Lições sobre a filosofia política de Kant.
Rio de Janeiro: Relume-Dumará, 1993.
SCRUTON,
Roger. Bebo, logo existo: guia de um filósofo para o vinho.
Tradução Cristina Cupertino. São Paulo: Octavo, 2011.
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