As
eleições brasileiras de 2018, seguindo o modelo das eleições
presidenciais americanas de 2016, funcionaram como um laboratório
para o que serão as disputas eleitorais mundo afora a partir de
agora: divulgação descontrolada de notícias falsas, uso de robôs
para a manipulação da rede, violência simbólica e física contra
eleitores oponentes, etc – tudo apontando para um futuro no qual os
vencedores serão aqueles que conseguirão o domínio primeiramente
nas terras sem lei do mundo digital.
Em
grande parte, foi graças a isso que Jair Bolsonaro venceu as
eleições e se tornou, hoje, Presidente eleito.
Mas
não só por isso. Não foi apenas seu “capital digital”
que o levou à Presidência. O desencanto e a desesperança de parte
das “massas” com aqueles que percebiam como sendo a “elite
política” e com sua ineficiência frente aos problemas
enfrentados pela sociedade foi o motor que levou um legislador
incompetente e irrelevante ao Planalto.
Gostaria
de enfatizar, novamente, o que vejo como o motor dessas eleições:
foi o desencanto e a desesperança de parte das “massas” com
aqueles que percebiam como sendo a “elite política”. As
“massas” não estavam desencantadas nem desesperançadas com a
política em si – como se pode verificar através de seu empenho
nas campanhas de seus candidatos –, mas com aqueles que essas
mesmas massas viam como a “elite política”. Por conta da
genialidade marqueteira do agora Presidente eleito, ele é descrito
por seus militantes como um “outsider” da política, apesar de
ser parte da elite política desde 1989. Seus esforços
marqueteiros transformaram seu discurso populista e semifascista no
“encanto” e na “esperança” duma parte do eleitorado.
Mesmo
se Bolsonaro não vencesse a disputa eleitoral, já teria vencido um
processo de divisão da sociedade iniciado anos atrás pelo PSDB e
pelo PT – processo que reforçou a estereotipização
demonizante do lado oposto como inimigo real, e não apenas como
oponente político: o discurso do “nós” versus “eles” –
“nós”, as vítimas, versus “eles”, os corruptos/criminosos
(é bom lembrar que o PT fez uso desse discurso durante os governos
do PSDB, e o PSDB fez uso do mesmo durante os governos do PT). Essa
estereotipização demonizante levada ao extremo – através
principalmente da divulgação de notícias falsas (o que poderia
representar melhor um modus operandi [semi]fascista?) – foi
a marca das campanhas de 2018. E o agora Presidente eleito foi o
melhor representante do uso dessa arma em sua campanha. Dividir a
sociedade, jogando eleitores uns contra os outros em favor duma
candidatura, se tornou a chave para vencer a disputa eleitoral.
A
estereotipização do outro sempre foi uma característica das
disputas partidárias (você, talvez, poderia até dizer que é
exatamente isso que estou fazendo aqui). Neste segundo turno, essa se
acirrou, em grande parte, por conta da ausência do debate de
propostas. O agora Presidente eleito, que já se mostrara deveras
incapaz de manter um diálogo construtivo com jornalistas,
escondeu-se atrás de sua recuperação pós-atentado – um fato
utilizado como maquiagem de medroso – para não ser derrotado por
sua incompetência em dialogar com alguém de quem discorda. Assim,
seus eleitores votaram “no escuro”, comprando um discurso
populista temperado com fortes elementos fascistóides, sem conhecer
exatamente as propostas(?) de seu candidato para administrar o país.
Esses eleitores depositaram sua confiança no processo eleitoral,
mesmo que seu candidato ridicularizasse o mesmo, e levaram seu
candidato à vitória.
O
que resta, agora, aos eleitores que se opuseram ao falso outsider, o
legislador que acumulou 29 anos como membro da elite política? O que
se pode esperar dum Presidente eleito que, mesmo antes de ser
candidato já desprezava o Estado Democrático de Direito? [É
sempre bom nos lembrarmos de que o Estado brasileiro é um Estado
“Democrático”, apesar de, enquanto Deputado, o agora Presidente
eleito desprezar o processo e o sistema democráticos.]
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