A comunidade cristã se perde com muita facilidade em emaranhados teológicos inúteis. Ao menos, é o que acredito. Com isso não quero dizer que fazer teologia seja algo inútil. O que faço aqui é teologia – os visitantes mais “conservadores” podem entender essa como sendo “má teologia”, mas é teologia assim mesmo. Discutir nossas compreensões a respeito do sentido das questões mais elementares de nossa existência no mundo é fazer teologia. Para alguns, Deus é um elemento necessário a essa discussão – e é, ao menos para a maioria dos cristãos, não todos -, para outros, eu incluso, o elemento mais necessário nesta discussão é nossa relação com outros seres humanos e com a vida como um todo. Quando falo em “emaranhados teológicos inúteis”, me refiro às discussões dogmáticas que tiram de foco o espírito do ensinamento de Jesus.
Muito do que ocorreu no universo teológico cristão durante as eras justifica-se pelas circunstâncias históricas: concílios, credos, reformas, confissões, etc. A Reforma Protestante alemã, por exemplo, trouxe-nos a sola fide (princípio material da Reforma) e a sola scriptura (o princípio formal da Reforma), que seriam complementadas por três outras no decorrer da construção do Protestantismo lutero-calvinista: solus Christus, sola gratia, soli Deo gloria.
Obviamente, como ocorreu com os textos dos credos surgidos nos primeiros séculos da igreja cristã, as confissões protestantes não falam nada sobre os ensinamentos de Jesus. Todos eles, os credos e as confissões, dos primeiros séculos até o século XIX, referem-se à morte de Cristo e a concepções sacrificiais para proclamarem a fé da igreja, mas deixam de fora todo o ensinamento de Jesus a respeito de amor, perdão, doação, caridade. O mais interessante é que a igreja teve de esperar pelos hereges para que declarações de fé fizessem menção aos ensinamentos de Jesus como sendo a base para um viver cristão autêntico: os unitaristas.
Dessa ausência de menção explícita ao cerne da tradição cristã (=amor/caridade), foi de onde surgiu minha concepção pessoal de SOLA CARITAS. Ainda no Seminário passei a compreender que se tivesse de escolher uma noção capaz de sumariar os ensinamentos atribuídos a Jesus pelas Escrituras e pela tradição, essa deveria ser uma menção ao amor que ele proclamara em palavra e ação.
Como unitarista, não acredito que Jesus tenha morrido para me salvar de meus pecados. O que me salva, em Jesus, é seu ensinamento. Jesus nos “salva” por nos mostrar o caminho para Deus. O caminho para Deus – que é amor – é a prática do amor, que é o próprio Deus (ou seja, o caminho de Jesus é um caminho infinito: para se chegar a Deus [=amor], você tem de “praticar” o próprio Deus [=amor]). Esse amor, que os evangelhos chamam de “caridade”, é aquilo que foi espelhado na vida do próprio Jesus. Se Deus é amor, e se Jesus praticou o amor em sua vida e ministério, não é difícil chegar à conclusão de que Jesus realmente era uno com Deus. Por o amor ser parte integrante da vida do próprio Jesus, de acordo com os autores dos evangelhos, podemos afirmar, sem receio, que Jesus é divino, já que sua vida foi uma manifestação do próprio Deus [=amor].
É dessa justificativa, aparentemente confusa, e muito herética para alguns, que surge minha defesa da noção de SOLA CARITAS: o amor [=caridade] é o único caminho para Deus, é só através dele que somos “salvos”. Somente o amor / a caridade .
+Gibson
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