Como todos vocês, fui surpreendido pelo anúncio da morte de Osama bin Laden, no último domingo; e, como alguns de vocês, fui tomado por um sentimento de reflexão quanto ao significado do acontecimento. Como alguém que teve uma relação muito próxima com pessoas atingidas pelo horror perpetrado por terroristas malucos, imagino o que muitas dessas pessoas possam estar sentindo agora.
Como um cristão comprometido com o “espírito de Jesus” (o que chamo de “sola caritas”), seu ensinamento de amor e perdão, choco-me com as manifestações pseudopatrióticas de alguns de meus irmãos norte-americanos (apesar de compreender o que leva-lhes a agirem como agem). Como cristão, imagino a voz do rabino galileu ensinando seus seguidores a amarem seus inimigos, apesar de, como ser humano, saber o quão difícil é por isso em prática. É só pensar nas figuras vivas em nosso imaginário coletivo (Adolf Hitler, Wellington Menezes de Oliveira, o próprio Osama bin Laden, e tantos outros e outras), e tentar lembrar que Jesus se referia a pessoas como eles, a pessoas que fizeram o que eles fizeram – pois “amar”, na tradição dos evangelhos cristãos, não tem o sentido novelesco ou hollywoodiano: amar era, e é, um exercício complexo e trabalhoso, uma missão.
Como ser humano, e como cristão unitarista, não celebro a morte (o assassinato) de nenhum outro ser humano. Não importa o quão horrendas tenham sido as ações perpetradas por essa pessoa. Como unitarista, acredito no valor e dignidade de cada um dos seres humanos sobre a terra, não importando se não vejam os outros seres humanos dessa mesma forma. Logo, o que foi feito a Osama bin Laden é uma tragédia patética e uma sabotagem dos valores que nós ocidentais dizemos defender. É uma afronta aos valores liberais – em seu sentido político e religioso. É uma afronta ao Direito Internacional, e uma afronta aos ideais presentes na Constituição dos Estados Unidos.
Os brasileiros e nacionais de outros países, que não os Estados Unidos, podem pensar que Osama bin Laden não é seu problema. Estão enganados. Quando os Estados Unidos foram atacados, a lógica das ações dos terroristas era a de se manifestarem contra a ideia de mundo que o “Ocidente” (uma construção ideológica) representava. Obviamente, seu alvo principal era os Estados Unidos; mas as ideias que atacavam eram as ideias do mundo ocidental – liberdades política, ideológica, religiosa, financeira; diversidades sexual, cultural, religiosa, identitária, etc. Logo, todo o “Ocidente” foi juntamente atacado. Se não fora este o caso, por que não atacaram apenas Washington? Por que Nova York, a chamada “capital do mundo” e sede das Nações Unidas? Na realidade, suas ações foram um ataque à humanidade (uma outra construção ideológica) – como conjuntamente a definimos em documentos aceitos pela maioria dos países membros das Nações Unidas.
Pensando nas ações desses terroristas, somos impulsivamente levados a esquecer dos próprios princípios que levaram à sua repulsa pelo ideário ocidental e que nós dizemos defender. Um desses princípios é o de que os seres humanos têm direito a um julgamento justo (em termos do processo), têm o direito a se defenderem e mesmo o “direito” a pagarem por seus crimes de forma não arbitrária. Terroristas como Bin Laden e os membros de seu clube negam aos demais seres humanos esses direitos, mas, apesar disso, os princípios pelos quais dizemos viver afirmam que eles têm esses direitos (independentemente de suas ações). Quando agentes americanos invadem um país e matam a Bin Laden arbitrariamente, estão cuspindo nos princípios de nossas noções do que seja civilização e humanidade (princípios defendidos pela Constituição americana e que, supostamente, guiam as operações desses agentes), além de estarem zombando da memória das vítimas do 11 de setembro e de tantos outros episódios drásticos. A memória das vítimas de Bin Laden, assim como a memória da fundação de nossa noção de humanidade e civilização, seria(m) honrada(s) se ele tivesse sido levado a um tribunal e julgado por seus crimes, e aí, então, tivesse pago o preço pelo que fez.
É nisso que acredito, como humano e como um cristão unitarista.
+Gibson
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